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JANIO DE FREITAS
Ruído na transmissão
Em discurso no Rio, Lula
brindou-me ontem duas
gentilezas. Uma delas, sempre
esperada -a crítica. Disse ele:
"Até o meu amigo Janio de Freitas escreveu um artigo fazendo
críticas sem entender o que eu
tinha falado. Foi o seguinte:
"Nós estamos, em apenas cinco
anos, fazendo 21% das linhas de
transmissão de tudo o que foi
construído em 122 anos"".
Mesmo os amigos de Lula não
podem ouvir todos os seus discursos -é dispensável explicar
por quê. Em alguns casos, precisam recorrer às notícias que
transcrevem trechos de discursos e sintetizam outras partes.
Prática usual, inevitável e secular no jornalismo diário. Posta
em uso, mais uma vez, na citação que baseou a nota citada
por Lula: não se referiu a "linhas de transmissão", mas ao
"que foi construído em 122
anos", porque a notícia original
não falou em linhas de transmissão, mas no construído "nos
últimos 122 anos".
Pela outra gentileza, a do tratamento pessoal, meu agradecimento.
Os agitadores
A discutível instabilidade do
ministro Antonio Palocci, nos
últimos dez dias, teve na terça-feira o seu dia mais inflado de
boatos de exoneração ou renúncia, com a apropriada agitação.
Mas compensou seus aspectos
negativos com um punhado de
indícios coerentes e úteis para
perceber-se, um pouco mais, esse lado da atual crise: ficou claro, ou confirmado, que tem partido das próprias cercanias do
ministro uma boa parte, senão a
maior, das "confidências" que
alimentaram a boataria.
É comum que um assessor, para mostrar-se integrante do poder, forneça inveracidades a jornalistas mais atraídos pela fácil
ficção do que pela cansativa
apuração do fato. Mas quando
a iniciativa é de um grupo, por
pequeno que seja, é evidente que
a motivação não está no pequeno exibicionismo. Há um propósito comum, uma coordenação com vistas a um fim determinado.
Não há dúvida de que foi desproporcional e induzida, em
grande parte, a relevância dada
por jornais e TVs à entrevista da
ministra Dilma Rousseff, discordante da idéias de arrocho
transformado em lei para impor-se pelo futuro afora. Mas,
também sem dúvida, sua artificialidade foi muito útil, politicamente, a Palocci. Além da intimidação que causou nos parlamentares, sobre eles lançou
pressões empresariais e outras,
para que se contivessem nos interrogatórios sobre temas delicados para o ministro.
Os espetáculos de bajulação
mútua e explícita, entre o depoente Palocci e a oposição falsamente inquiridora, no Senado
como na Câmara, tiveram mais
motivos do que a reconhecida
habilidade do ministro e a inapetência incompetente dos parlamentares.
A discordância é real -ainda
bem. A dimensão foi sobretudo
artificial.
Sinal
Vários indicadores da pesquisa CNT/Sensus mereceram comentários nos jornais, mas a
mim foi um outro que mais chamou atenção: as respostas à pergunta sobre o envolvimento de
Lula com a corrupção discutida
nas CPIs. Os convictos de que "o
presidente Lula participou da
corrupção" perfazem 42,8% dos
pesquisados. São mais numerosos que os 41,3% convencidos de
sua inocência.
Essa divisão é o dado da pesquisa que mais se projeta para
2006. E é, entre todos os tipos de
dados ora coletados pelas pesquisas, o de mais difícil esvaziamento por ações da Presidência
sobre a opinião pública.
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