São Paulo, Quinta-feira, 25 de Março de 1999
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MISTÉRIO EM ALAGOAS
Promotor vai reconstituir crime e pedirá à Justiça para intimar o legista Badan Palhares
Morte de PC voltará a ser investigada

MÁRIO MAGALHÃES
enviado especial a Maceió


O promotor Luiz José Gomes de Vasconcelos, 39, anunciou ontem a retomada das investigações das mortes do empresário Paulo César Farias e de sua namorada Suzana Marcolino da Silva, mortos com um tiro cada em 23 de junho de 1996 na casa de praia do empresário em Guaxuma, bairro a 8 km do centro de Maceió. As investigações estavam paradas desde fevereiro de 1998.
Vasconcelos fará a reconstituição das mortes. Pela primeira vez no caso, todos os seguranças e funcionários de PC que reconheceram estar no terreno na ocasião (jardim, casa de empregados, guarita, prédio principal) serão convocados para participar.
Vasconcelos pedirá à Justiça para intimar o legista Fortunato Badan Palhares, professor da Unicamp e coordenador da equipe que assinou o laudo oficial sustentando que PC foi assassinado por Suzana e que ela se suicidou em seguida.
O laudo fundamentou o inquérito policial, que reafirmou a tese sobre a morte do ex-tesoureiro de campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
O promotor quer saber por que está errada a altura de Suzana utilizada por Palhares na simulação das mortes, conforme a Folha revelou ontem com base em fotografias de PC e da namorada juntos, de corpo inteiro.
Para Palhares, ela tinha 1,67 m, o que tornaria plausível que a bala que a atingiu tivesse penetrado pelo peito, como ocorreu. Mesmo usando salto alto, no entanto, Suzana era menor do que PC, que media 1,63 m. Se ela tivesse se suicidado como descrito no laudo oficial, a bala teria passado sobre um ombro ou atingido a sua cabeça.
""Essa é uma falha que fica meio complicado para justificar", afirmou Vasconcelos. ""O princípio básico de qualquer exame de corpo é que você tenha no mínimo a altura da pessoa. Isso não pode ser depois presumido com base em documentos."
A altura de Suzana e a posição em que ela se encontrava ao ser atingida pela bala haviam sido questionadas em 1997 por um laudo complementar, assinado pelos legistas Daniel Muñoz (professor da USP) e Genival Veloso de França (professor aposentado da Universidade Federal da Paraíba), pelo especialista em balística Domingos Tochetto e pelo perito Nicholas Passos. ""Era óbvio que o conflito estava diretamente relacionado à altura", disse o promotor.
""A Folha trouxe o elemento que faltava. Com esse elemento novo eu tenho um fato, uma prova real de que a altura não era a descrita no laudo inicial. Nós passamos a vislumbrar uma nova versão para esse crime."
Na época das mortes, policiais suspeitaram de duplo homicídio: Suzana poderia ter matado PC e sido morta por outra pessoa ou ambos poderiam ter sido assassinados por terceiro(s). Vasconcelos se recusa a falar sobre as hipóteses.
Promotor da 3ª Vara Criminal de Competência Não-Privativa de Maceió, o promotor afirmou que planejava exumar novamente o cadáver de Suzana, para medir sua altura com base no tamanho de ossos. ""Com as fotos, porém, a questão se esgota."
Ele disse que pedirá a Badan Palhares uma avaliação sobre o que seria modificado na dinâmica das mortes com base na altura real.
O promotor também chamará os quatro peritos que assinaram o laudo complementar, para pedir mais detalhes.
Para os autores do contralaudo, Suzana morreu em movimento, levantando-se da cama, inclinada para a frente, em posição de quem queria se defender. As características são estranhas a suicidas, de acordo com Muñoz e França.

Reconstituição
Com a reconstituição do crime, o promotor pretende avaliar o relato de cada funcionário e segurança. Todos afirmaram que não ouviram os tiros -PC teria morrido até as 2h e Suzana, entre 5h e 7h, conforme análise de alimentos nos estômagos dos dois realizado pela legista Maria Tereza Pacheco.
Exame de audibilidade realizado pelos autores do segundo laudo concluiu que em qualquer local do terreno era possível ouvir os tiros. ""Quero a reconstituição de todo o movimento acontecido no dia do crime", disse o promotor.
""Várias hipóteses serão analisadas, onde as pessoas estavam em cada momento. A reconstituição será fiel aos horários descritos, para que eu tenha um retrato mais próximo possível do que aconteceu. É fundamental trabalhar com as pessoas envolvidas, até para sentir o emocional de cada um."
Vasconcelos vai reinquirir várias testemunhas, inclusive a caseira Marisa de Carvalho. De acordo com a jornalista Ana Luiza Marcolino Noaro, irmã de Suzana, uma pessoa teria ouvido a caseira culpar um segurança pela morte.
Vasconcelos assumiu o caso em fevereiro de 1998, mas não convocou a polícia para novas diligências. ""Solicitar o envolvimento da polícia mais uma vez seria enxovalhar ainda mais o caso, porque estaria caindo em completa falta de credibilidade com a opinião pública", afirmou.
O ministro Renan Calheiros (Justiça) defendeu ontem a realização de um novo laudo para eliminar dúvidas sobre a versão oficial.
Segundo ele, o ministério e a Polícia Federal estão à disposição das autoridades alagoanas para providenciar esse eventual novo laudo.


Colaborou a Sucursal de Brasília


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