São Paulo, Quinta-feira, 25 de Março de 1999
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CELSO PINTO
Sobram dólares para intervir


O Banco do Brasil voltou a comprar um volume estimado entre US$ 100 milhões e US$ 150 milhões ontem, o que impediu que a cotação do dólar caísse abaixo de R$ 1,84. Em 3 dos 5 dias úteis da semana passada, as reservas cambiais aumentaram, por compras do Banco Central no mercado por meio do BB.
Nesta semana e na próxima, os vencimentos de bônus chegam a US$ 1,6 bilhão, considerados alguns vencimentos do início de abril, cujo câmbio terá que ser comprado ainda em março: por exemplo, US$ 260 milhões da Petrobrás. Contudo, excluindo os bônus cujos recursos o mercado sabe que já foram comprados antecipadamente, estão faltando apenas cerca de US$ 550 milhões. Em compensação, está entrando cerca de US$ 1 bilhão de volta dos fundos externos (Fiex).
O BC gastou, até agora em março, US$ 1,2 bilhão de reservas (contando a entrada de US$ 1 bilhão do dinheiro do BID). Pelo acordo com o FMI, podia gastar até US$ 3 bilhões. Pode, portanto, gastar ainda US$ 1,8 bilhão, mas já está claro que vai precisar de muito menos.
Vai entrar em abril, portanto, com uma boa folga. Pelo acordo com o FMI, poderia gastar US$ 2 bilhões em abril. É possível que tenha uma "sobra" bem superior a US$ 1 bilhão de março, além do que vier a captar por meio do bônus (no mínimo US$ 1 bilhão). Não é irrealista supor que tenha, em abril, um "colchão" de até US$ 4 bilhões para gastar, se for preciso.
É uma virada impressionante de humor no mercado, ajudada pelo acordo com o FMI, os bons resultados da inflação e os estímulos aos capitais de curto prazo. Há duas semanas, de segunda a sexta-feira, o BC teve que gastar US$ 1,147 bilhão de suas reservas para evitar pressões sobre o câmbio. Na semana passada, fechou com um ganho líquido de reservas de US$ 36 milhões, de sexta a sexta.
Parte das compras de dólares do BB, diz um banco, vai para o pagamento de um bônus da Sabesp, cujo câmbio terá que ser fechado nesta sexta-feira. São US$ 275 milhões mais juros, o que deve somar uns US$ 300 milhões. Em compensação, o Bradesco estava fechando ontem uma emissão de US$ 150 milhões de bônus.
Está claro que uma boa parte do dinheiro que está entrando é "dólar verde-e-amarelo", dinheiro que bancos, empresas e indivíduos tiraram do país antes da flutuação do câmbio. É difícil calcular quanto já voltou, mas um banqueiro diz que o quase US$ 1 bilhão que o BC emitiu em títulos indexados (NTNs cambiais) recentemente deve ter alimentado, basicamente, esse dinheiro. A remuneração é fantástica.
Se o investidor externo não quiser correr risco de desvalorizações, compra uma NTN cambial rendendo 31% acima do dólar e embolsa, líquidos, uns 19%. Se topar correr mais riscos, investe a 45% em reais e ainda pode ganhar um extra se continuar a valorização em relação ao dólar. Não há nada igual no mundo.
Como é um dinheiro de curtíssimo prazo, especulativo e volátil, está longe de ser um capital confiável para financiar o balanço de pagamentos a médio prazo. Talvez por essa razão, o BC relute em aceitar uma queda muito forte na cotação do dólar, antes de consolidar uma virada mais consistente, vinda de saldos na balança comercial e de investimentos diretos.
Tem havido maior oferta, também, em linhas comerciais, mas a recomposição é mais lenta. O fato é que quanto mais dólares entram, mais aumenta a confiança externa, o que ajuda a atrair ainda mais dólares.
Também está entrando dinheiro externo na Bolsa: o saldo líquido foi positivo em R$ 450 milhões nos primeiros 20 dias de março. É, em parte, um ajuste a uma redução muito forte nas posições recentes no Brasil.
Muitos fundos internacionais, por exemplo, usam como base o índice latino-americano do banco Morgan Stanley. O índice reflete os valores relativos de cada mercado.
Antes da crise da Rússia, o Brasil chegava a ser 42% do total da carteira teórica latino-americana do Morgan. Caiu muito depois e, por um breve instante, o México, com 32%, passou o Brasil, com 30%.
Essa queda relativa levou os fundos que seguem a carteira teórica do Morgan a vender ações brasileiras para manter a proporção, reforçando a queda. Além disso, os estrategistas do Morgan recomendavam aos investidores que tivessem uma posição inferior à da carteira teórica.
Com a recuperação recente do mercado brasileiro, a posição relativa subiu, ao mesmo tempo em que o banco passou a recomendar posições acima da posição na carteira teórica. Muitos fundos começaram a comprar Brasil para ajustar suas posições, ajudando a reforçar a alta.



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