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"CPI é farol para mariposas", diz especialista
Giuseppe Bacoccoli, pesquisador da Coppe-UFRJ, afirma que diretoria da estatal é muito política e "até quem é técnico tem indicação"
Para Bacoccoli, que atuou na empresa de 1965 a 1997, investigações podem pôr em risco o cronograma
de produção do pré-sal
SAMANTHA LIMA
DA SUCURSAL DO RIO
Tido como um dos maiores
especialistas em petróleo do
país, o pesquisador da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em
Engenharia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro) Giuseppe Bacoccoli acredita que a
CPI da Petrobras tenha potencial de atrasar o cronograma de
produção das reservas do pré-sal. A CPI se propõe a investigar
as mais recentes denúncias envolvendo a empresa, como a
manobra contábil para pagar
menos Imposto de Renda.
Bacoccoli, que trabalhou na
estatal de 1965 a 1997, avalia
que a diretoria atual é "muito
política". Para ele, a CPI é como
"um farol aceso que atrai mariposas", mas a empresa sairá
bem das investigações.
FOLHA - Que consequências a CPI
pode trazer para a Petrobras, em termos operacionais e de negócios?
GIUSEPPE BACOCCOLI - Consequências futuras só haverá se
algo não estiver nos eixos. Mas
é claro que, operacionalmente,
se a CPI se estender e suspeitas
se avolumarem, podemos chegar a uma situação de questionamentos e até suspensões das
licitações para compra de equipamentos. Isso poria em risco o
cronograma da companhia,
principalmente em relação ao
pré-sal. Realmente, a administração do PT vem tomando
conta da Petrobras há muitos
anos, mas, se tudo tiver sido
conduzido de acordo com o esperado, será melhor.
FOLHA - Dos temas indicados para
investigação qual o senhor acha que
tem maior potencial de trazer problemas para a empresa?
BACOCCOLI - As maiores denúncias deverão aparecer em relação às suspeitas de fraudes de
refinarias e plataformas e também nos royalties. Mas é o que
disse: se a empresa estiver correta como espero que esteja,
não haverá maiores problemas.
Na questão do Imposto de Renda, vejo tudo com naturalidade.
Quando fazemos Imposto de
Renda como pessoas físicas,
sempre podemos adotar este
ou aquele modelo, usar esta ou
aquela dedução. Foi isso que a
empresa fez, ao que me parece:
procurou a forma legal de pagar
menos imposto. Na questão
dos royalties, a lei é muito clara
e não há o que ser questionado.
FOLHA - O sr. ouve histórias de
fraudes?
BACOCCOLI - Não tenho como
dizer se ou como elas ocorrem.
FOLHA - Há um mês, a Folha noticiou que um assessor do presidente
da Petrobras, José Sérgio Gabrielli,
comandava um esquema de repasses de recursos a entidades que organizavam festas juninas na Bahia,
e que algumas eram ligadas ao PT. O
sr. acredita que poderá haver dificuldade em explicar histórias como essa aos senadores?
BACOCCOLI - Trabalhei na Bahia
entre 1965 e 1968 como funcionário da Petrobras, e esse tipo
de acusação é e sempre foi
constante, infelizmente. Não
sei como ele explicará.
FOLHA - O que o sr. acredita que
Gabrielli terá mais dificuldades em
explicar no depoimento à CPI?
BACOCCOLI - O mais difícil não
vai ser explicar, mas fazer os senadores entenderem e levarem
em consideração o que ele fala,
já que todos estão ali para aparecer. Parece-me que, neste
momento, nada do que ele disser mudará alguma coisa.
FOLHA - O senhor acredita que, se a
empresa não estivesse tão em evidência pela questão da descoberta
das reservas no pré-sal, a CPI sairia?
BACOCCOLI - A história do pré-sal ajuda a atrair a atenção dos
políticos para a empresa, lógico. Essa CPI é como um farol
para mariposas.
FOLHA - O calendário eleitoral, então, é outro estímulo?
BACOCCOLI - Sim, e vão aproveitar para, mais uma vez, questionar o marco regulatório [desde
que a Petrobras anunciou as
descobertas de possíveis reservatórios na camada abaixo do
sal, na bacia de Santos, o governo estuda mudar o modelo de
exploração]. Vão novamente
evocar o modelo da Noruega,
que tem uma estatal que administra reservas e escolhe quais
empresas podem produzir.
Mas ninguém lembra que, na
Noruega, a produção de petróleo cai 7% ao ano e, no ritmo
atual, o petróleo acabaria em
oito anos. Esse é o modelo que
querem trazer para cá.
FOLHA - Qual é sua avaliação sobre
o posicionamento do presidente Lula, que criticou a criação da CPI?
BACOCCOLI - O presidente tem
uma relação dúbia com a empresa, e isso é resultado do fato
de ele querer faturar ao máximo com ela. Não à toa, ele vive
sujando as mãos de petróleo
quando há campos novos em
produção, quando a empresa
levou o país à autossuficiência
em petróleo. Mas, recentemente, ele anda puxando a orelha da
empresa, dizendo que ela tem
que entender que não é maior
do que o Brasil.
FOLHA - A Petrobras vem buscando
apoio de financiamento no exterior
para conseguir fechar as fontes de
recursos de seu plano de investimentos, de US$ 174 bilhões em cinco anos. Uma CPI poderá atrapalhar
a empresa nesse sentido?
BACOCCOLI - Acredito que não.
Acho até que, ao fim, ficará
comprovado o vazio de muitas
denúncias, o que até facilitará a
tarefa de trazer apoio estrangeiro aos projetos, porque pode
deixar claro que a empresa tecnicamente é muito séria, e eu
acredito nisso.
FOLHA - Qual é sua avaliação sobre
a diretoria da Petrobras?
BACOCCOLI - Tirando um nome
ou outro, é muito política. Até
quem é técnico, como a Graça
[Maria das Graças Foster, diretora de gás e energia], tem indicação, no caso dela, da Dilma
[Rousseff, ministra da Casa Civil]. O Barbassa [Almir Barbassa, diretor financeiro] é nome
do Gabrielli, que, por sua vez, é
nome do PT.
FOLHA - O sr. identifica outros momentos na história em que ela foi
tão politicamente usada como hoje?
BACOCCOLI - Não.
FOLHA - E quais são as consequências disso?
BACOCCOLI - Ela perde em eficiência operacional. A questão
da construção das plataformas
é um exemplo. A empresa tem
que contratar a maior parte do
serviço no Brasil porque o governo quer, e não porque é necessariamente melhor para ela.
A Petrobras está sempre à mercê do interesse político. A questão dos combustíveis é outra.
Hoje a Petrobras ganha com a
defasagem de preços da gasolina em relação ao preço internacional do petróleo. Mas, no passado, a empresa já perdeu muito dinheiro com isso.
FOLHA - Mas o sr. acredita que a
empresa poderia estar em outro patamar, técnica e operacionalmente,
se não fosse a interferência política?
BACOCCOLI - Não, tecnicamente
a empresa evoluiu, e muito.
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