São Paulo, Domingo, 25 de Julho de 1999
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Cidade tem "viúvas" de vivos

do enviado especial

a Santana da Boa Vista (RS)

Eutália Xavier Almeida, 72, aposentada, sustenta dois filhos e três netos com a pensão de R$ 130. O genro, Arci Vargas, saiu para procurar emprego e não voltou mais. A filha Ana Cristina, 25, é mais uma "viúva" de marido vivo de Santana da Boa Vista.
Eles moram na Serra dos Vargas, interior do município mais pobre da metade sul. A região serrana é bonita. A terra é fértil e tem água em abundância. É quase incompreensível a miséria que se espalha por aqueles vales.
O prefeito, Ruy Antônio de Freitas (PMDB), 44, tem explicação para tanto atraso: "É uma questão até cultural. O povo do interior é tudo "pêlo duro" (mestiço de branco e índio). Não tem nem um de origem européia. As cidades mais desenvolvidas têm colonizações alemã e italiana".
"O município é pobre porque sempre foi uma área pobre", conforma-se o vice-prefeito, Gasparini Teixeira (sem partido). Ele diz que o subsolo é rico em mármore, granito e calcário, mas "faltam empresas para explorar".
Santana tem a menor rede de eletrificação rural do Estado e não conta com um único quilômetro de estrada estadual ou municipal asfaltada. A BR-392 corta o município. A vila existe desde 1885, mas somente em 1997 foi construída uma estação de tratamento de esgoto.
Com 8.500 habitantes, tem 60% da população no interior, basicamente em minifúndios. De geração em geração, as pequenas propriedades foram sendo fracionadas até se tornarem insuficientes para o sustento das famílias.
Sem terra para trabalhar, muitos agricultores procuram emprego nas lavouras de arroz em Pelotas, Santa Vitória do Palmar ou até no norte do Estado. Alguns deixam a família e não voltam.
O prefeito acha que a reforma agrária "ajudaria" o município, mas faz uma ressalva: "Desde que as terras não sejam ocupadas por vagabundos".
Ao lado da casa de pau-a-pique coberta com capim santa-fé, Eutália não reclama. "O ranchinho (cesta básica do programa Comunidade Solidária) é que quebra o galho. Deus ajuda os pobres, porque trabalho está difícil."
O filho Ozi de Almeida, 36, quebrou a perna em uma granja, em Santa Vitória. Voltou para casa com oito parafusos no corpo. Tentou, mas não conseguiu se aposentar por invalidez. (LV)

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