São Paulo, quarta-feira, 25 de agosto de 2004

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CAMPO MINADO

Homens armados tentam tirar de fazenda na BA os invasores, que reagem

Conflito entre seguranças e sem-terra deixa 60 feridos

Margarida Neide/"A Tarde"
Seguranças da fazenda Monte Cristo aguardam em delegacia após serem presos por tentarem expulsar 350 sem-terra da propriedade


LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SALVADOR

Um confronto entre seguranças de uma fazenda em Camaçari (BA) e integrantes do MLT (Movimento de Luta pela Terra) deixou 60 feridos -dois em estado grave-, dois carros e uma moto incendiados e 72 presos, todos funcionários da propriedade.
O conflito aconteceu anteontem à noite, quando os seguranças armados com escopetas, revólveres e facões tentaram expulsar cerca de 350 sem-terra que invadiram a fazenda Monte Cristo e estão acampados nela há quase duas semanas. Com 6.000 hectares, a propriedade já foi invadida três vezes pelos sem-terra nos últimos nove meses. Os agricultores alegam que a fazenda é improdutiva. Por decisão da Justiça, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) não pode realizar ações de vistoria na área.
Segundo o juiz federal João Batista Cássio Júnior, a propriedade contém remanescentes importantes de mata atlântica e não serve para reforma agrária. No processo, o juiz analisou documentos encaminhados pelo Centro de Recursos Ambientais da Bahia e pela ONG SOS Mata Atlântica. O MLT admite que a fazenda tem área de mata atlântica, mas que está apta a ser usada para a agricultura.
A PM de Camaçari (região metropolitana de Salvador) somente chegou à propriedade por volta das 21h de anteontem, duas horas depois do início do conflito. Mesmo assim, todos os 72 seguranças da Monte Cristo foram presos.
"Também encontramos dois ônibus que foram utilizados para transportar os seguranças, eletrodomésticos, roupas, celulares, alimentos e remédios que foram saqueados no acampamento", disse a delegada Jesuína Maria Gonçalves. No acampamento dos sem-terra, ela disse que foram apreendidos três revólveres calibre 38.
Em depoimentos de ontem, os seguranças declararam que foram contratados pelo delegado Tadeu Caldas Viana Braga, um dos sócios da fazenda. Segundo a delegada, ele deverá ser ouvido pela Corregedoria da PM, após o interrogatório de todos os seguranças.
"O delegado Tadeu Viana Braga pôs um revólver na minha boca e falou que me mataria se não contasse onde estavam nossos líderes", disse a sem-terra Francisca Ribeiro. Lotado em Rio Real (BA), Braga não foi trabalhar ontem, segundo funcionários da delegacia.
Durante o tiroteio, 15 crianças fugiram para o matagal que cerca a propriedade. Após quase 12 horas, todas foram encontradas.
Um dos feridos graves é Elinaldo Pereira dos Santos, 23, que está internado em Salvador, atingido por tiros nas costas e golpes de facão. Já em Camaçari está internado Domingos Bispo dos Santos, 30, atingido por um tiro no peito. Santos seria um dos seguranças.
No conflito, os sem-terra reagiram com tiros, coquetéis molotov e rojões. A Prefeitura de Camaçari enviou ontem dois ônibus para transportar os sem-terra, mas um líder afirma que eles não sairão.


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