São Paulo, segunda-feira, 25 de outubro de 2004

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Falcão defende alianças e nega loteamento de cargos no governo

CHICO DE GOIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Quase 25 anos após ter ajudado a fundar o PT, o advogado e jornalista Rui Falcão, 60, candidato a vice na chapa de Marta Suplicy (PT), diz acreditar que as empresas contribuem para campanhas para ter acesso ao governo.
Ele ressaltou, porém, que a gestão do PT "não concedeu privilégios" aos doadores. Formado em direito pela USP, sua principal atividade foi o jornalismo: trabalhou no "Jornal da Tarde", na Folha de S.Paulo e chegou a ser diretor da revista "Exame". Líder estudantil na USP nos anos 60, Rui militou no PCB e no grupo VAR-Palmares durante o regime militar, tendo ficado preso por três anos. Integrante do campo majoritário do PT, Rui minimiza as críticas ao apoio de Paulo Maluf a Marta. Diz que não houve aliança com ele, só uma declaração de apoio à petista:
 

Folha - Qual é a importância do vice para o senhor?
Rui Falcão -
Em um futuro governo nosso, eu seria uma pessoa de apoio, como fui quando secretário de Governo, já que não há expectativa de ela se ausentar.

Folha - O sr. acha que o eleitor se preocupa em saber quem é o vice?
Falcão -
Há uma preocupação difusa, por conta de episódios anteriores [em que o vice assumiu o cargo].

Folha - Na época em que se optou por seu nome, o PMDB pleiteava a vaga. A prefeita chegou a dizer que o partido não se mostrava confiável, por isso optou pelo sr. Por que o vice não foi do PMDB e acabou sendo o sr.?
Falcão -
Nós vínhamos discutindo com o PMDB municipal uma coligação proporcional. Em nenhum momento o PT debateu a coligação em torno do vice. Quem colocou a questão do vice foi o [Orestes] Quércia, de uma forma muito breve, sem nenhum tipo de discussão, e isso foi descartado. Não havia essa política de desconfiança. Na verdade nós temíamos que um vice em uma campanha polarizada, como prevíamos, pudesse a qualquer momento colocar dificuldades. Não do ponto de vista de desconfiança, de honestidade ou da honradez de alguém do PMDB. Imagine se, no meio da campanha, o vice resolve se manifestar, discordando de uma política que estamos propondo. Isso criaria uma desestabilização.

Folha - Alguns vereadores eleitos pelo PTB [que se aliou ao PT] já manifestaram apoio a Serra. A coligação não ajudou a eleger o inimigo?
Falcão -
Isso parece muito engenharia de obras feitas. Tem de fazer a pergunta: se não tivesse a coligação com o PTB, se não tivesse o apoio naquela ocasião, se não tivesse o tempo de TV, qual teria sido o resultado eleitoral? Visto a posteriori, pode-se dizer que se perdeu vagas. Mas, e naquela ocasião? Qual teria sido nosso caminho? Tinha um quadro eleitoral totalmente diferente de hoje.

Folha - Como secretário de Governo, o sr. conseguiu aprovar diversos projetos de interesse do Executivo. Como se deu sua atuação para aprovar esses projetos?
Falcão -
Primeiro você tem de ter muita capacidade de diálogo e de audiência. Tem de ouvir as pessoas, saber em que terreno está pisando, elaborar os projetos em conjunto. Eventualmente aglutinar forças, eventualmente isolar uma para atrair as outras.

Folha - Algum vereador pediu dinheiro para aprovar projetos?
Falcão -
Para mim, nunca.

Folha - E para outra pessoa?
Falcão -
Que eu tenha conhecimento, não. A aprovação de projetos sempre passou por contemplar o interesse específico de um vereador. Vários projetos nós sancionamos porque eram bons ou, às vezes, eram projetos que não faziam mal a ninguém, inócuos, mas que entram no jogo do convencimento do vereador. Participação no governo também, sem nenhuma precondição.

Folha - O PSDB qualifica isso como loteamento. É um loteamento?
Falcão -
Acho que não. Loteamento é o que havia na época do [ex-prefeito Celso] Pitta, em que ele entregava uma regional para um vereador e ele fazia o que quisesse. Nós nunca fizemos isso.

Folha - Os vereadores dizem que essa participação se dá da seguinte forma: um indica o subprefeito, mas o chefe-de-gabinete não é dele. É dessa forma que acontece?
Falcão -
Não. O Quércia, por exemplo, no governo dele deixou as pessoas participarem das estatais, mas indicava os diretores financeiros. Era um jeito de fazer um controle orçamentário, fiscal, e às vezes até das licitações e coisas do tipo. Nós fazemos controles políticos das subprefeituras.

Folha - Vocês, do PT, sempre comparam a atual administração com a anterior. Dizem que receberam uma herança maldita e que havia muita corrupção. Houve corrupção nesta administração?
Falcão -
Não. Teve casos pontuais de pessoas acusadas de cobrarem propina. A Marta pôs mais de cem pessoas para fora da administração. Todos as denúncias foram apuradas. Não houve corrupção com secretários, negociatas, como no governo Pitta.

Folha - Luiza Erundina levantou suspeitas de corrupção na licitação do lixo. As empresas de lixo passaram a ser grandes parceiras do PT?
Falcão -
Elas nunca foram grandes parceiras do PT. Houve algumas que contribuíram, na forma da lei. Nós defendemos contribuição pública de campanha. Não há nenhuma contrapartida de alguém que contribua e depois é favorecido. A Erundina levantou suspeitas sem nunca comprovar nada. Foram denúncias levianas.

Folha - O sr. crê que as empresas dão dinheiro aos candidatos sem ter interesse em alguma coisa, simplesmente pelas idéias do candidato?
Falcão -
Normalmente as grandes contribuem para mais de um candidato. Eu imagino que elas querem ter possibilidade de aproximação com os governos. De nossa parte nunca houve nenhum compromisso, ao receber doações, de conceder qualquer privilégio ou favorecimento.

Folha - Quem doa consegue se aproximar mais facilmente?
Falcão -
Não sei. Antônio Ermírio sempre fez as maiores doações entre os tucanos. E tem relações próximas com todo mundo. Posso dizer também o contrário: não discriminamos quem não contribuiu. Nunca alguém deixou de ser recebido porque não contribuiu.

Folha - Acha que foi um erro admitir que a saúde tem problemas?
Falcão -
Não, porque seria ingenuidade supor que se nós não tivéssemos tocado na questão ela não seria abordada pelos adversários. Segundo, uma das principais características da Marta é a sinceridade. Trabalhar contra os fatos seria artificial do ponto de vista do caráter dela e da campanha. Houve um processo para melhorar a saúde. Sabíamos que havia problemas. O Eduardo Jorge não foi demitido porque não queria que houvesse injunções políticas na secretaria dele. Foi demitido porque estava administrando mal.


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