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PÚBLICO & PRIVADO
Medida do ministro permitirá o acesso de órgãos da administração inclusive a movimentações bancárias
Palocci autoriza acesso a bases da Receita
CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, autorizou, por despacho, acesso dos órgãos da administração à base da Receita Federal, incluindo a movimentação
bancária. Publicada no "Diário
Oficial" de 29 de setembro, a medida permite que a Procuradoria
Geral da Fazenda Nacional -representante da União nos processos de execução fiscal- obtenha,
on-line, dados fiscais e bancários
do contribuinte sem autorização
judicial.
A decisão é amparada num parecer da própria Procuradoria, segundo o qual "o Estado é um só".
Daí a possibilidade de compartilhamento das "informações econômico-fiscais" sem que seja considerado quebra de sigilo.
Pela decisão, a troca de informações entre a Receita e a Procuradoria "deve ser ampla e irrestrita", e "o compartilhamento de informações entre órgãos integrantes da administração tributária federal não significa quebra de sigilo". Nesse caso, a "custódia da informação sigilosa passa para o
respectivo solicitante".
Ainda segundo o despacho, a
consulta tem de ser justificada administrativamente e um termo
aditivo a convênio existente permitirá acesso on-line à base de dados. Como a compatibilização do
sistema depende de um trabalho
do Serpro, a abertura só deve
ocorrer em janeiro próximo.
Para a Procuradoria, o grande
avanço será o acesso à movimentação bancária do contribuinte,
fornecida mensalmente pelo BC à
Receita. Avalista do parecer, assinado pela procuradora Denise
Lucena Cavalcante, a procuradora-geral-adjunta da Fazenda Nacional, Telma Bertão Correia Leal,
não esconde a intenção: com base
nas informações, o bloqueio direto -e também por meio eletrônico- das contas dos contribuintes
em dívida com a União.
Além disso, há outras vantagens. Hoje, é disponibilizado à
Procuradoria o cadastro do Imposto de Renda de Pessoa Física,
por exemplo. Mas as declarações
só são fornecidas em papel, em
atendimento a ofícios. Com a medida, os procuradores terão senhas de acesso direto ao sistema.
Violação
Embora o despacho assinado
por Palocci trate exclusivamente
dos órgãos da administração tributária federal, a medida aprova
um parecer que, ocupando três
páginas do "Diário Oficial", condena o sigilo absoluto e prega a
troca de informações em toda administração pública.
Para juristas, no entanto, a medida fere o princípio, assegurado
no artigo 5º da Constituição, de
que o sigilo de dados é inviolável.
Além de ameaça a um direito
constitucional, para o advogado
Álvaro Luís Fleury Malheiros, esse conceito de Estado único é "extremamente perigoso".
"É uma visão totalitária com a
qual não posso concordar, como
cidadão ou advogado", criticou.
Após analisar o parecer e seu regimento interno a pedido da Folha, Malheiros ressaltou que, apesar de pregar a troca de informações entre órgãos da administração fazendária, a Procuradoria é
representante legal da União.
"Não é órgão de fiscalização nem
de administração fazendária. Esse
parecer força um pouco", frisou.
Para o advogado Ives Gandra, é
flagrante a quebra de sigilo na medida. Segundo ele, até pelo instrumento legal -um despacho-
essa decisão afronta a Constituição, ainda que a Lei Complementar 105/2001, na qual se baseia, seja mantida pelo Supremo Tribunal Federal.
Chamando o Estado de Grande
Irmão, numa alusão ao livro
"1984", de George Orwell, Gandra
lembra lembra que existem três
ações de inconstitucionalidade
contra a lei complementar que
permitiu a transferência automática de dados do Banco Central à
Receita. "Mesmo que seja considerado legal, esse despacho é inconstitucional porque alarga o alcance dessa quebra de sigilo. Estão pisoteando a Constituição."
Bertão, por sua vez, diz que tem
interpretação diferente da Constituição. Para ela, o sigilo não está
previsto na Constituição. Além
disso, argumenta, "ninguém está
violando sigilo. Mas compartilhando o dever de sigilo". "A gente sabia que o parecer provocaria
polêmica. O Judiciário é que vai se
pronunciar."
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