São Paulo, quinta, 25 de dezembro de 1997.




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CELSO PINTO
A fuga do capital "ruim"


A crise asiática fez o Brasil perder cerca de US$ 4 bilhões em aplicações externas em renda fixa. Até agora, muito pouco deste dinheiro voltou, entre outras razões, pelas dúvidas sobre o novo sistema de tributação.
Existem dois canais básicos para o investimento externo em renda fixa. Um é pelo câmbio livre, por meio dos fundos de investimento via Anexo 6. Outro é pelo câmbio flutuante, transitando pelas contas de não-residentes (as famosas CC-5).
Os investimentos externos em renda fixa são aquele tipo de capital que o Banco Central costumava classificar de "ruim" e "especulativo", por ser mais volátil do que outros capitais, como os investimentos diretos. Depois da crise asiática, contudo, nunca mais se falou em capital bom e ruim e, para ajudar a engordar novamente as reservas, qualquer capital passou a ser bem-vindo.
No caso dos investimentos via Anexo 6, é possível medir o impacto da crise asiática. O estoque passou de US$ 3,6 bilhões em setembro para US$ 2,6 bilhões em outubro, uma queda de 29%.
Já no caso dos investimentos via CC-5 não há números oficiais disponíveis. O Banco Indosuez é o maior intermediário nesse tipo de aplicação no país. Antes da crise, seu estoque de investimentos era de US$ 4 bilhões. A crise provocou uma saída de US$ 600 milhões, uma queda de 15%. Mais recentemente, o estoque voltou a aumentar, mas em apenas US$ 60 milhões.
Marcos Lederman, diretor do Indosuez, estima que o estoque de investimentos em renda fixa via CC-5 era de US$ 15 bilhões antes da crise e que hoje está em torno de US$ 12 bilhões. Algumas razões explicam por que a retomada destes investimentos tem sido tímida, apesar dos juros recordes.
Uma é o receio com o câmbio flutuante. Nem todos os investidores externos gostam de aplicar aqui via Anexo 6. Aplicar por meio do flutuante, contudo, traz um risco a mais. Existe um ágio, em torno de 0,5%, do flutuante em relação ao câmbio livre. O flutuante vive em déficit: por ele saem dólares gastos com turismo, cartões de crédito, renda fixa e contrabando de fronteira. Se o BC quiser, o ágio pode subir e acabar com o lucro de quem quiser repatriar aplicações.
No passado, os investidores preferiam aplicar via flutuante para evitar pagar o IOF de 2% cobrado no Anexo 6, mas hoje ele também se aplica aos investimentos via CC-5. Lederman acha que os investimentos em renda fixa subiriam rapidamente se o BC aceitasse transformar as aplicações externas já existentes em renda fixa via CC-5 em Anexo 6, acabando com o risco do flutuante.
Outro problema é a confusão na tributação. Mesmo antes da mudança recente, alguns administradores tributavam o investidor externo em 10% sobre os ganhos de capital, enquanto outros cobravam 15% sobre os rendimentos. A elevação da alíquota para 20% atinge todas aplicações via CC-5, mas as regras ainda não estão claras.
Os papéis serão tributados pela sua variação nominal e em bases semanais. Mas, e se houver uma valorização do papel em mercado? A regra diz que os fundos deverão contabilizar os papéis reavaliando para cima seu preço, mas, neste caso, um mesmo papel pode ser tributado várias vezes por ganhos de capital.
Lederman acha que a tributação deveria ser simplificada e que os títulos federais deveriam ficar isentos do IR, como faz o México. O que o governo recolhe como IR paga a mais como juros. Como o IR, contudo, é dividido em 40% com os Estados e municípios, na verdade ele dá prejuízo ao governo federal.
O investidor em renda fixa vem ao Brasil atraído pela arbitragem que existe entre o custo mais barato do dinheiro no exterior comparado à remuneração que terá aqui. A margem aumentou recentemente, mas, considerando o custo de proteção futura contra desvalorizações do câmbio e o IR, o líquido fica abaixo de 11%. Se o investidor não tiver ainda uma posição aqui e tiver que pagar o IOF de 2% na entrada, seu ganho cai bastante, considerando que o custo de tomar este dinheiro a curto prazo em dólares está em torno de 7,5% a 8%.
O juro brasileiro é recorde, mas o cupom cambial não. Na Rússia, por exemplo, o cupom líquido é de 20%.




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