São Paulo, segunda-feira, 26 de junho de 2006

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ELEIÇÕES 2006 / LEGISLATIVO

Eleição para o Congresso ajuda político sob suspeita

Parlamentares só podem ser investigados pelo STF, que nunca condenou nesses casos

Pouca estrutura de tribunais superiores contribui para a impunidade; Maluf e Palocci podem ser beneficiados se vencerem vaga na Câmara

LILIAN CHRISTOFOLETTI
ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Mais que defender os interesses da população, as eleições de outubro serão uma "tábua de salvação" para muitos políticos acusados de crimes comuns. Uma vitória poderá garantir a eles o privilégio de adiar as investigações e seus julgamentos para um futuro bem distante, com grandes chances de não serem punidos.
Isso é possível porque a legislação garante a deputados federais e a senadores o direito de serem julgados penalmente apenas pelo STF (Supremo Tribunal Federal), instância máxima do Judiciário, que, na opinião de especialistas ouvidos pela Folha, não tem estrutura nem vocação para processar parlamentares.
Para Carlos Velloso, ex-presidente do STF, a situação abre espaço para que os acusados escapem da investigação. "É claro que políticos com problemas na área criminal desejam o foro privilegiado. Nos tribunais superiores, como não há estrutura para cuidar de tantos processos, as situações acabam caindo na impunidade", disse.
Na história do Supremo, nunca houve um processo concluído que terminasse em condenação. Todos foram absolvidos ou arquivados.
Se não fossem eleitos, os políticos passariam pelos mesmos trâmites impostos a um cidadão comum. Seriam processados em primeira instância e poderiam recorrer aos tribunais superiores na seguinte ordem: Tribunal de Justiça, Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.
Apesar de o foro privilegiado "pular" a estrutura do Judiciário e ir direto à última instância, o procurador da República Rodrigo de Grandis diz ser incorreto o argumento de que isso acelera o julgamento. "Como o STF não tem vocação para processar, os casos acabam ficando parados, não andam."
No caso dos políticos eleitos, o Supremo tem de autorizar a abertura da investigação e, depois, o início do processo.

Lentidão
Um levantamento feito pela Folha em 82 pedidos encaminhados pela Procuradoria Geral da República ao Supremo, desde 1995, para abertura de inquérito contra parlamentares, 38 foram arquivados, 17 voltaram para a primeira instância porque o político renunciou ou não foi reeleito e 27 ainda estão em trâmite.
Os arquivamentos ocorreram por falta de provas, por desistência das partes ou por prescrição -quando se esgota o prazo em que alguém pode ser processado. E quando o político renuncia, o processo retorna para a Justiça de primeira instância.
Todo o trâmite é lento. No caso da denúncia oferecida pelo procurador-geral da República Antônio Fernando de Souza contra os 40 acusados pelo escândalo do mensalão, o ministro do STF Joaquim Barbosa já avisou que levará um ano para apreciar o pedido de abertura de processo.
Para o ministro do STF Sepúlveda Pertence, a remessa de processos por crime comum à última instância do Judiciário subverte a finalidade do Supremo. "Nós vamos ficar discutindo o superfaturamento de uma ponte quando deveríamos discutir o cumprimento da Constituição", afirmou ele.

Beneficiados
Entre os políticos que poderão ser beneficiados pela imunidade parlamentar estão o ex-ministro Antonio Palocci (PT) e os ex-prefeitos Paulo Maluf (PP) e Celso Pitta (PTB).
Palocci deixou o cargo após a acusação de ter ordenado a quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, que o acusou de freqüentar a "casa do lobby" em Brasília, que seria usada como uma central para negócios de lobistas.
Se o ex-ministro não for eleito deputado federal neste ano, terá de enfrentar um inquérito da Polícia Civil de São Paulo por suposta formação de quadrilha e lavagem de dinheiro e outro da Polícia Federal pela quebra ilegal do sigilo e procedimentos investigatórios do Ministério Público.
Maluf e Pitta, que estão com os bens bloqueados e são investigados por desvio de recursos públicos e envio ilegal de verbas para o exterior, também verão seus processos serem postergados de forma indefinida se forem eleitos.
A legislação brasileira permite que políticos processados, mesmo aqueles que já têm alguma condenação, mas que não transitaram em julgado (sem uma condenação definitiva), disputam cargos eletivos.


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