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CIÊNCIAS SOCIAIS
Para intelectuais, pressões exigirão mudança paulatina na economia
PT terá de romper ortodoxia, afirmam cientistas políticos
SYLVIA COLOMBO
RAFAEL CARIELLO
ENVIADOS ESPECIAIS A CAXAMBU
Pressionado tanto pelas demandas sociais quanto pelo mercado
financeiro, o rumo de um eventual governo do PT será o da saída
paulatina da ortodoxia econômica, avalia o cientista político Carlos Ranulfo, professor titular da
UFMG (Universidade Federal de
Minas Gerais).
Ele participou nos últimos quatro dias do 26º Encontro Nacional
da Anpocs (Associação Nacional
de Pós-Graduação e Pesquisa em
Ciências Sociais), encerrado ontem, em Caxambu (MG).
"O PT tem um rumo geral: trabalha para fazer mudanças paulatinas na relação com essa ortodoxia. Como é que vai ser a saída
dessa rigidez com a ortodoxia,
com o caminho do FMI? Isso também vai ter que ser conversado,
mas vai ter que sair", disse.
Para o professor mineiro, o possível governo de Luiz Inácio Lula
da Silva vai se ver cercado "por
dois fogos": o do movimento social e o do mercado financeiro.
Se quiser garantir a governabilidade, diz Ranulfo, o PT terá que lidar com mais ênfase com o problema social e, para isso, abrir
mão da ortodoxia econômica.
"Se tiver que pôr na balança a
ortodoxia monetária e fiscal, de
um lado, e a segurança, de outro,
qual pesa mais? O que contribui
mais para a ingovernabilidade?
São os 3,75% [de superávit primário] que o FMI diz para fazer ou as
pessoas parando o comércio na
Baixada [Fluminense]?"
"O Brasil está ingovernável, não
porque o mercado acha isso ou
aquilo, mas porque está crescendo brutalmente a violência."
Uma das consequências da eleição de Lula, diz o cientista político
Renato Lessa, do Iuperj (Instituto
Universitário de Pesquisa do Rio
de Janeiro), "é tornar inevitável"
um reequilíbrio entre a manutenção "de certos parâmetros de responsabilidade fiscal" e a agenda
social. "O peso ponderado dessas
coisas vai mudar", afirma.
Uma das promessas de campanha do PT, na tentativa de ganhar
a credibilidade do mercado financeiro, foi o compromisso de Lula
com regras da ortodoxia econômica, expresso na "Carta ao Povo
Brasileiro", divulgada em junho.
Pressões
Segundo o cientista político mineiro, o melhor caminho que Lula
tem para "se garantir entre essas
pressões que vai sofrer" é o do
prometido pacto social, que Ranulfo considera viável.
"O Lula vai ser submetido a intensas pressões. É um teste para a
capacidade do que ele vai ter de
fazer, aquilo que ele anunciou:
um pacto. A sorte do governo Lula está na sua capacidade de fazer
uma grande concertação."
Renato Lessa concorda que a
saída para um governo Lula, pressionado pelas demandas sociais
reprimidas, é ir além da negociação política e parlamentar.
"Não basta ter uma base política
de sustentação parlamentar. É
preciso ter uma base social de sustentação. Essa base tem de ser a
definição de cenários, espaços nos
quais os vários interesses vão ter
de negociar", diz.
Para o pesquisador do Iuperj, o
"drama social" será "tão real para
a agenda do próximo governo
quanto foram, para a agenda deste governo que está terminando,
os compromissos internacionais
e a preservação dos arranjos financeiros".
Lessa diz que a constituição de
um pacto representará uma mudança na tradição brasileira de
aversão ao conflito: "Ou eu estou
em conflito com você, ou igual a
você". Com o PT, afirma, o modelo é de "confronto e negociação".
Outra novidade antevista por
ele é a institucionalização da pressão. "Isso vai exigir dos movimentos sociais uma demanda
mais qualificada politicamente."
Sobre o MST (Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem-Terra), especificamente, ambos consideram pouco ameaçadora sua
pressão anunciada. João Pedro
Stédile, um dos principais líderes
do movimento, disse recentemente que, se o PT não responder
às demandas sociais, "pode virar
um [Fernando] De la Rúa [ex-presidente argentino que renunciou após pressão popular, em dezembro de 2001]".
Segundo Ranulfo, o movimento
social teria mais a perder com
pressões ao governo que o mercado financeiro. "Stédile e todo movimento social sabe que Lula é um
aliado, muito mais que Fernando
Henrique Cardoso, e sabe que
tem a perder se desestabilizarem
um governo Lula. Não vão achar
nada mais à esquerda", afirma.
Lessa diz que "o MST tem que
ser colocado nos seus devidos termos". "O problema brasileiro hoje é urbano. O peso real que o MST tem é muito pequeno."
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