São Paulo, terça-feira, 27 de março de 2007

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JANIO DE FREITAS

A escolha poderosa

Ao entregar os destinos da capital paulista a Gilberto Kassab, Serra se fez o mais poderoso eleitor do Brasil

EM SUAS respostas ao Datafolha, os moradores de São Paulo-capital apontaram para uma das deformações eleitorais de mais necessária e urgente correção, dada a arbitrariedade com que exclui o eleitorado da escolha de seu governante, exatamente como nas ditaduras. Considerado péssimo ou ruim pelo montante espetacular de 42% dos paulistanos, Gilberto Kassab foi tornado prefeito, para dirigir a mais importante cidade brasileira, sem para tanto receber nem sequer um voto de eleitor.
O poder do maior eleitorado urbano do país foi substituído pela vontade de uma só pessoa. Imposta duas vezes. Na primeira, José Serra desprezou as contrariedades eleitorais e partidárias e fez de Kassab e seu discutido passado o complemento da chapa à prefeitura.
Mal passara um ano da administração de esperados quatro, José Serra entregou os destinos da capital a Kassab, em flagrante desprezo pelo conceito dominante no eleitorado paulistano.
José Serra se fazia o mais poderoso eleitor do Brasil.
Deixadas à parte quaisquer questões éticas e morais, já por se tratar de interesse político, o que importa é não ter havido ilegalidade na imposição de Kassab como prefeito, tal qual em tantos outros casos semelhantes (o de Serra distingue-se também pelo breve tempo, um quarto do mandato, em que cumpriu a escolha do eleitorado paulistano, ao qual apelara por vontade própria). O absurdo está permitido pela legislação.
Os vices têm alto custo financeiro -federal, nos Estados e nos municípios- e nenhuma serventia especial. Em ausência do governante, a cadeia (sem trocadilho) de ocupação do cargo está prevista com as presidências do Legislativo e do Judiciário. Expor e confirmar a irrelevância do vice deu até certo prazer a Fernando Henrique e a Lula, com seus arranjos para fazer agrado a Inocêncio Oliveira, Antonio Carlos Magalhães, Aldo Rebelo e outros, fazendo-os presidentes interinos, por afastamento simultâneo do titular e do vice.
O absurdo da cara inutilidade é lapidado com o absurdo da imposição ao eleitorado. Desde que obrigatório o voto conectado para presidente e vice, ninguém vota no vice. Mal se sabe ou, na maioria, nem se sabe quem é esse tal, nas chapas para governo estadual e prefeitura. A escolha é um arranjo político ou, com mais freqüência do que parece, um negócio financeiro.
A ocupação do poder pelo vice, portanto, quando não apenas interina, pode ter legalidade, mas legitimidade não tem. É, mais do que antidemocrática, uma extensão de vícios ditatorialescos, que precisa ser extirpada.
Os 42% de avaliação péssima ou ruim nem são o que o eleitorado paulistano dá a Kassab. Ninguém deseja um governante regular, condição que é uma espécie de tolerância bondosa dos estatísticos para os políticos. Governante regular é ruim, no mínimo deve metade do que deveria fazer. Logo, a rejeição a Kassab é de 42 mais 36%: 78% negativos produzidos por sua imposição ao eleitorado.

Mais uma
Quem está com viagem aérea prevista para amanhã, acautele-se ainda mais. Além de chuva, névoa, cindactas, infraeros, anacs e controladores, a Polícia Federal estará em greve parcial. Operação tartaruga nos aeroportos, como se os cidadãos comuns fossem responsáveis pelos vencimentos de policiais. Até que são, mas por pagá-los com os impostos.
As greves e manifestações que só prejudicam as pessoas comuns são uma forma abominável de direitismo.


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