São Paulo, segunda-feira, 27 de abril de 2009

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Doleiros que agem em SP operam do Uruguai, aponta PF

Manobra ilegal visa driblar controle mais rigoroso sobre operações financeiras no Brasil, que depende de vizinho para reprimir delitos

Nova geração de doleiros prefere atender a poucos clientes grandes só para reduzir o risco de exposição a interceptações, diz polícia


FLÁVIO FERREIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Investigações da Polícia Federal indicam que cerca de 90% dos doleiros que agem atualmente no Estado de São Paulo realizam suas operações a partir de pequenas salas ou casas no Uruguai e mantêm escritórios e funcionários no Brasil apenas para receber e entregar valores a seus clientes.
Segundo a PF, os doleiros fixaram-se no Uruguai porque naquele país o controle sobre operações financeiras é menos rigoroso que no Brasil.
Procuradores da República também apontam que a "nova geração" de doleiros está atuando apenas para poucos clientes que, porém, movimentam altas quantias de dinheiro.
Essas estratégias buscam diminuir o número de transações e comunicações para reduzir a exposição a interceptações da PF, sem, no entanto, reduzir a lucratividade dos negócios.
A maior parte da remuneração dos doleiros resulta de comissões de 0,5% a 1% e da variação das taxas de câmbio calculadas sobre suas transações.
O uso de empresas e esquemas ilegais no Uruguai por doleiros brasileiros não é novidade. O que mudou é que eles passaram a montar seus "escritórios centrais" naquele país.
O delegado Ricardo Saadi, chefe da Delegacia de Combate a Crimes Financeiros da Superintendência da PF em São Paulo, diz que, "do Uruguai, os doleiros mantêm contatos com seus clientes e somente as liquidações dos negócios é que estão sendo feitas no Brasil".
Segundo Saadi, tal situação leva a PF a depender mais da cooperação do Uruguai para reprimir os delitos. "A colaboração [das autoridades uruguaias] é similar à de países que são paraísos fiscais. Para que ela ocorra, é necessária a comprovação de que as remessas de valores tiveram origem no tráfico de drogas ou em corrupção, dentre outros crimes", afirma.
O delegado da PF Rodrigo Carvalho diz que os criminosos também criaram um novo elo na cadeia de seus negócios. Empresas não financeiras, com atividade lícita e operação normal, como uma fábrica de chocolate ou uma confecção no bairro Bom Retiro, por exemplo, estão servindo de ponte para os contatos entre as "sedes" dos doleiros no Uruguai e suas "filiais" no Brasil.
A comunicação por e-mail ou telefone do doleiro com o Brasil é feita somente com essas pequenas empresas. A partir daí, as instruções de entrega ou recebimento de valores são gravadas em CDs ou DVDs e levadas aos escritórios dos doleiros no Brasil por motoboys.
"Essa tática tem como objetivo evitar que a polícia descubra, por meio de interceptações, a localização do escritório onde fica o dinheiro das operações ilícitas", segundo Carvalho.
O procurador da República Silvio de Oliveira cita o doleiro Antonio Oliveira Claramunt, o Toninho da Barcelona, preso desde 2004, para dar um exemplo de uma conduta abandonada pelos principais doleiros.
Oliveira afirma que Toninho operava com outros 20 doleiros, o que o deixava muito vulnerável aos grampos da PF.
"Antes, a partir da interceptação de um doleiro "pequeno", era fácil chegar àqueles com maior volume de operações. Em razão da atuação das autoridades, os doleiros ficaram mais cautelosos e acabaram preferindo trabalhar de uma maneira mais seletiva", afirma.
Segundo a procuradora da República Anamara Silva, essa nova característica tem um aspecto positivo. "Esse tipo de "fidelização" na atuação dos doleiros permite que os clientes deles sejam identificados com mais facilidade pelas autoridades", diz a procuradora.


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