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JANIO DE FREITAS
O país dos
sem-governo
É tão grande que chega a ser
ridícula a má-fé de puxar para o número de manifestantes
as pretensas respostas à "Marcha". Pendurar-se nesse expediente é só um modo néscio de
se mostrar batido. Se 50 mil,
60 mil ou 100 mil se concentraram contra o governo, tanto
faz. A marcha não tinha finalidade aritmética, entre as várias que lhe foram atribuídas.
Nem os adversários -governantes nos palácios, povo nas
ruas- confrontavam-se em
um jogo de números, mas no
terreno em que se opõem a
opressão econômica, de uma
parte, e direitos e necessidades
vitais, na outra.
Todo o problema brasileiro
atual (e futuro, por certo) sintetiza-se neste fato: Fernando
Henrique Cardoso e o governo
não têm o que dizer, com honestidade, sobre a situação
crítica a que levaram o país
-e nem está próximo o fim
dessa linha corrosiva de não-governo. Foi o mutismo sem
saída, de Fernando Henrique
e dos governistas, que a marcha forçou a evidenciar-se.
Êxito que independe de quantas tenham sido, a mais ou a
menos, as dezenas de milhares
da "Marcha", no achado perfeito de José Simão, "dos Sem
Mil".
A propósito, transcrevo, pela
utilidade de sua leitura ou releitura, trechos do insuspeito
editorial "A grande frustração", da Folha de ontem, referentes ao mais recente balanço do IBGE:
"A renda per capita caiu, a
carga de impostos subiu, a
participação dos rendimentos
do trabalho na renda do país
declinou, o PIB encolheu. (...)
A indústria se retraiu. O setor
de serviços cresceu, mas só
porque nessa conta está a expansão das telecomunicações.
Em resumo, os brasileiros estão ficando mais pobres, mas
não todos. (Este) é o caso de
setores que se beneficiam de
apoio estatal explícito (...).
"É evidente que em boa medida essas estatísticas refletem
uma crise. (...) O índice da
massa real de salários ajuda a
entender a insatisfação. O
processo de erosão do poder
aquisitivo teve início em 96,
(...) mas ela prosseguiu. Desde
outubro do ano passado, a
massa real de salários caiu assombrosos 7,6%."
Nessa realidade opressiva
para três quartos da população, fustigados ainda pelo desemprego não mencionado,
estão "as origens da impopularidade". Está o Brasil atual,
país dos sem-governo.
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