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RETROSPECTIVA
Presidente tucano tem base de apoio heterogênea
Perfil de conciliador é marca de FHC em seu primeiro mandato
do Conselho Editorial
A deputada
Maria da Conceição Tavares
(PT-RJ) costuma lembrar que,
desde os tempos
já algo remotos
em que era apenas acadêmico, Fernando Henrique Cardoso sempre tentou a síntese entre posições que, não raro,
eram absolutamente antagônicas.
O acadêmico virou político, o
político virou presidente, mas o
conciliador continua encarnado e
dominante em FHC. Talvez tenha
sido exatamente essa a mais forte
marca de seu primeiro mandato.
O presidente gastou seu tempo
tentando conciliar as posições de
sua heterogênea base de apoio parlamentar.
O próprio FHC, ao falar do futuro, confirma indiretamente que esse foi o seu grande trabalho durante o primeiro período de governo.
"Não vou gastar meu tempo em
convencer as pessoas; espero que
elas já estejam convencidas", disse,
na quarta-feira, ao anunciar o novo-velho ministério, em alusão à
saliva gasta com seus aliados.
É verdade que a expressão "gastar tempo" nem sempre figura no
vocabulário do presidente, mesmo
em seu trabalho de síntese entre
posições inconciliáveis. Para ele,
"numa democracia complexa como a brasileira, não se avança sem
que se juntem as forças, sem que
haja um sistema de alianças, às vezes até contraditório, mas que tenha uma resultante".
O problema é saber se, primeiro,
houve de fato avanços e, segundo,
qual a resultante de seus esforços
de conciliação.
A primeira questão receberá diferentes respostas conforme o gosto de cada qual, mas, de todo modo, o fato de FHC ter recebido um
segundo mandato permite inferir
que uma maioria, ainda que relativa, acha que houve, sim, avanços.
Já a segunda questão tem resposta negativa no próprio governo, ao
menos quando de suas discussões
internas mais íntimas.
Em 95, um encontro de intelectuais tucanos chegava concluiu
não que não havia um rumo no governo, mas que a sociedade não tinha certeza de qual era a direção
seguida. Nada ocorreu, de lá para
cá, a permitir uma reavaliação.
FHC tentou ser conciliador também na economia -ou foi obrigado a isso. O presidente tomou posse dez dias depois do colapso do
peso mexicano de dezembro de
1994, no primeiro sinal de que a
instabilidade financeira planetária
havia chegado para ficar.
O governo viu-se obrigado a segurar a economia, para evitar que
o consumo excessivo estourasse as
contas externas e tornasse o real
vulnerável.
Daí em diante, FHC foi forçado,
pelos acontecimentos externos, a
tentar a conciliação entre a necessidade de atrair capitais externos e,
com eles, financiar as contas internacionais do país e a necessidade
de empurrar o crescimento econômico interno que esbarrava justamente no limitado teto dado pela
debilidade externa sempre que a
economia se aquecia.
Nesse capítulo, a conciliação revelou-se francamente impossível.
A balança comercial (diferença entre exportações e importações) pulou de um superávit de US$ 10,5 bilhões em 94 para um déficit de US$
6 bilhões este ano.
A conta corrente (o conjunto das
transações com o exterior) saiu de
um déficit modesto em 94 (US$ 1,7
bilhão) para US$ 34 bilhões em 98.
Nem por isso o país está crescendo ao ritmo minimamente necessário para evitar que o desemprego
aumente. Ao contrário: o próprio
governo admite que, no primeiro
ano da segunda gestão FHC, a economia brasileira sofrerá uma contração de 1% (ou seja, produzirá
1% menos em bens e serviços do
que o fez em 98, um ano já fraco).
FHC pode jurar que, na política,
seu primeiro mandato encerrou a
fase de conciliação. Mas não pode
fazer idêntica promessa em relação à economia, até porque não
controla todas as variáveis.
(CLÓVIS ROSSI)
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