São Paulo, domingo, 27 de dezembro de 1998

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ALIADOS
Com a morte de Motta e a saída de Mendonça de Barros, tucanos paulistas perdem espaço no governo federal
Amigos de FHC mudam no 2º mandato

ELIANE CANTANHÊDE
Diretora da Sucursal de Brasília


O presidente Fernando Henrique Cardoso mantém o governo e o poder a partir da próxima sexta-feira, mas os amigos do primeiro mandato não serão necessariamente os mesmos no segundo.
Ao assumir a Presidência da República pela primeira vez, em 1994, FHC não recebeu apenas a faixa verde e amarela, mas também um abraço e um sorriso cúmplice do antecessor Itamar Franco.
Da segunda vez, Itamar será o grande ausente. Sorrindo para a oposição, ele continua disputando o título de "pai do Real" e prepara sua volta ao Planalto nas eleições de 2002, pelo PMDB.
Também farão falta duas peças-chaves do primeiro mandato: o ministro Sérgio Motta e o deputado Luís Eduardo Magalhães, ambos mortos em abril.
Os dois eram decisivos nas articulações do governo, sobretudo nas votações de emendas constitucionais no Congresso. Além disso, Motta foi o principal comandante do processo de privatizações.
Luís Eduardo, ao contrário de Motta, não teve até hoje um substituto à altura. Não porque ocupasse a liderança do governo -que não foi seu melhor momento-, mas pela proximidade com FHC e pela capacidade de articulação entre os diferentes partidos. Independente de cargos e funções.
Ele costumava fazer uma "dobradinha" com Motta, que jamais conseguiu superar uma relação de puro pragmatismo e muita desconfiança com o presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães, pai do deputado baiano.
Ministro das Comunicações, tucano de primeira hora, amigo e sócio de FHC numa fazenda, Motta era também o porta-voz de FHC quando a formalidade do Planalto e o estilo do embaixador Sergio Amaral impediam uma reação à altura dos ataques, ou um recado menos diplomático.
Seu substituto, tanto na função de ministro quanto na missão de falar grosso, também já está fora do governo: foi Luiz Carlos Mendonça de Barros, ligado aos tucanos paulistas e derrubado pelo grampo do BNDES durante a privatização das teles.
Mendonça de Barros caiu junto com seu irmão José Roberto Mendonça de Barros, da Câmara de Comércio Exterior, e com um dos economistas mais prestigiados do governo, André Lara Rezende, ex-presidente do BNDES.
Luiz Carlos, porém, não está totalmente fora do governo. Mesmo sem cargo, ouve, fala, interfere. Talvez esteja mais próximo ainda de FHC do que quando ocupava um ministério. Sua volta formal não é de todo descartada. Depende da decantação da crise do grampo.
Com a morte de Motta e o afastamento de Mendonça de Barros, quem perdeu espaço no governo foram justamente os tucanos, em especial os paulistas que mais ou menos abertamente sempre discordaram da política econômica de Pedro Malan (Fazenda) e Gustavo Franco (Banco Central).
Malan cresceu com sua atuação durante a crise financeira internacional que abalou o Brasil. Franco encolheu, perdendo um pouco de sua intimidade com FHC e de sua capacidade de influência sobre as decisões econômicas do governo.
O equilíbrio de posições entre Malan e Franco não afeta a posição dos tucanos que restaram a FHC: José Serra (Saúde) e Paulo Renato Souza (Educação) continuam fora da área econômica e dentro do Palácio da Alvorada, e o governador Tasso Jereissati (CE) é um consultor à distância.
Quem deve crescer no novo governo é o futuro ministro Pimenta da Veiga (Comunicações), que foi presidente do PSDB.
Paulista e também identificado com os tucanos, o chefe da Casa Civil, Clóvis Carvalho, sofre restrições no PSDB, no PFL, no PMDB, no PTB e até entre colegas de ministério. É daqueles que sobrevive no cargo e no governo graças a um único trunfo: a vontade do presidente. Num regime presidencialista, é o que basta.
Também mantêm uma ligação direta com FHC Eduardo Jorge Caldas Pereira, afastado da Secretaria Geral da Presidência desde a campanha eleitoral, Eduardo Graeff, que o substitui, e Ana Tavares, a assessora de imprensa de FHC desde 1983.
Entre os tucanos, a última baixa veio com a descoberta do câncer na bexiga do governador reeleito Mário Covas, já operado e convalescendo bem.
FHC é um intelectual que se alinhou às esquerdas e aos socialistas durante a ditadura militar. Covas é um político de carreira. E o mais expressivo líder do PSDB nacional.
A relação dos dois sempre foi de um certo mal-estar, quase de constrangimento mútuo. Mas FHC sempre soube contar com Covas nas horas mais difíceis. Quem conhece bem o governador diz que a fidelidade ao partido e aos companheiros é um traço de caráter.
² Lula
FHC foi buscar na oposição um antigo aliado dos tempos de combate à ditadura militar: Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Os dois se encontraram no dia 11 de dezembro, no Alvorada. Tomaram uísque, conversaram sobre os velhos tempos, trocaram risadas e falaram mal de um ou outro político.
"Uma conversa pessoal", definiu Lula depois, empurrando para o PT a decisão de formalizar uma lista de assuntos passíveis de conversas e eventuais negociações entre o partido e o governo.
Até onde a "conversa pessoal" de Lula e FHC pode evoluir ninguém sabe. Mas foi um gesto político importante do presidente para sinalizar a seus próprios aliados que tem para onde correr se fecharem o cerco sobre ele.
Depois da morte do filho Luís Eduardo, Antonio Carlos Magalhães se aproximou mais de FHC e tem repetidas vezes feito declarações de amizade e respeito. Mas as relações dos dois jamais foram e dificilmente serão de amizade, apenas de aliados no poder.



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