São Paulo, domingo, 28 de abril de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ELEIÇÃO ENGESSADA

Em segundo lugar nas pesquisas, tucano entra em atrito com publicitário e sofre pressões de PSDB, PMDB e PFL

Candidatura Serra vive impasse político

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Apesar do segundo lugar nas pesquisas, marca conquistada antes do planejado, a campanha do pré-candidato tucano ao Planalto, José Serra, está em crise.
Nos últimos dias, Serra entrou em atrito com o publicitário Nelson Biondi. Deixou sem respaldo o coordenador de campanha, Pimenta da Veiga. Sofreu pressão para engolir as indicações de vice do PMDB. Viu crescer a articulação do PFL para derrubá-lo. E reclamou do presidente Fernando Henrique Cardoso e do ministro da Fazenda, Pedro Malan, seu antigo desafeto, por quem foi indiretamente atacado.
O tucano voltou até a ter maior preocupação com a segurança, coisa que só ocorreu no Ministério da Saúde, num período em que a Polícia Federal fez um trabalho de proteção especial devido a ameaças que Serra sofreu por contrariar interesses da indústria farmacêutica.
Em meio a tantos problemas, dirigentes do PSDB e os aliados peemedebistas estão preocupados com a viabilidade de Serra. Avaliam que é o candidato quem tem causado mais problemas e começam a temer que ele não chegue ao segundo turno. No PSDB, brinca-se que, nessa batida, Serra acabará criando uma torcida organizada contra ele.
Por ora, apesar de uma crítica aqui e uma maldade ali, é o presidente Fernando Henrique Cardoso quem tem segurado Serra, ajudando-o a vencer obstáculos.

Campanha
Sempre cordato, o publicitário Nelson Biondi discutiu recentemente com Serra, que criticou a formulação da campanha, especialmente as gravações de TV para programas estaduais tucanos.
Biondi confidenciou a amigos que seu tapete está sendo puxado. Achou exagerado o ataque de Serra e viu no episódio o dedo do publicitário Nizan Guanaes, interlocutor frequente de Fernando Henrique Cardoso e crítico da campanha serrista.
Biondi está certo. FHC, que tenta desde o final de 2001 emplacar Nizan na campanha de Serra, disse ao pré-candidato tucano na terça que ele precisa trocar de marqueteiro ou dar um jeito de ouvir mais o publicitário baiano.
FHC disse a Serra o que Nizan fala em conversas reservadas: nesse ritmo, dificilmente Lula perderá a eleição. Para Nizan, a campanha de Serra está perdida, parecendo as do petista em 1994 e 1998. Haveria também gente demais mandando. Leia-se: seria ineficaz o colégio de marqueteiros sob a coordenação de Biondi.
Teve efeito a pressão de FHC. Nizan e Serra conversaram amigavelmente na última quarta, em uma festa brasiliense. Os dois, que se odiavam pela fracassada campanha à Prefeitura de São Paulo, melhoraram a relação.
Agora, falta arrumar o jeito de levar Nizan para a campanha. Biondi até aceita colaboração, mas o publicitário baiano só topa se for para ser o manda-chuva.

Ninho desarrumado
Depois de ter seus conselhos ignorados na crise entre o PSDB e o PFL no episódio Lunus, caso que sepultou a pré-candidatura presidencial da pefelista Roseana Sarney, Pimenta está sem poder.
Um tucano disse ao pré-candidato que falaria com Pimenta para resolver uma divergência regional entre PMDB e PSDB. Mas Serra desautorizou o coordenador, dizendo que problemas assim serão resolvidos diretamente por ele e mais ninguém. O episódio vazou e magoou Pimenta.
O coordenador de campanha sofre críticas da ala "PC", uma referência a tucanos que pertenceram ao antigo Partido Comunista, por estar procurando líderes do PFL. Para essa ala, não interessa uma aliança oficial com os pefelistas, mas apenas o apoio de algumas seções estaduais.
Para a turma do "PC", composta de pessoas como o prefeito de Vitória, Luiz Paulo Velloso Lucas, o deputado federal Alberto Goldman (SP) e o assessor de imprensa Milton Coelho da Graça, reatar com o PFL é dar uma marca de direita à candidatura. O interessante, crê esse grupo, é ter o PFL como satélite da aliança PSDB-PMDB.

Inimigos e aliados
Enquanto Pimenta namora o PFL, dirigentes do partido trabalham freneticamente para substituir Serra por outro tucano, o presidente da Câmara, deputado Aécio Neves (MG), ou o ex-governador do Ceará Tasso Jereissati (CE). A chapa está até pronta. O PFL topa abrir mão da vice para o PMDB indicar para a vaga, por exemplo, o presidente do partido, deputado Michel Temer (SP).
Essa hipótese é remota, mas tem enfurecido Serra e auxiliares. O grande trunfo para resistir a essa pressão é o presidente Fernando Henrique Cardoso, fechado com o pré-candidato. Aécio e Tasso, por exemplo, disseram a pefelistas e até a peemedebistas que os procuraram que acham dificílima a substituição de Serra.
Além de FHC, a maioria da cúpula do PMDB ainda está com Serra, apesar de contrariada com o veto dele aos dois preferidos pela direção para vice: o deputado federal Henrique Eduardo Alves (RN), favorito, e o ex-prefeito de Joinville (SC) Luiz Henrique.
Pressionado por FHC e pelo PMDB, partido que ameaçou não selar a aliança na convenção oficial de junho se Serra insistisse em ter como vice o senador Pedro Simon (RS) ou a deputada federal Rita Camata (ES), o pré-candidato tucano cedeu. A contragosto, deverá engolir um dos indicados pela cúpula do partido.
Mas essa refrega deixou mágoas na cúpula do PMDB, que se sentiu menosprezada. Esse grupo bancou a reeleição de FHC, o apoio ao governo e deseja fechar a aliança com Serra. A mando do pré-candidato, serristas como Goldman e o líder do PSDB na Câmara, deputado Jutahy Magalhães (BA), tentaram persuadir peemedebistas a aceitar Simon ou Camata.
Jutahy ouviu um sonoro não do líder do PMDB na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA). Os peemedebistas fecharam um acordo: só tratam do caso com Serra ou com Fernando Henrique Cardoso.
Na quinta, circulou no tucanato que, depois de tentar falar com Serra inúmeras vezes e ser muito bem recebido por uma assessora, Arthur Virgílio perdeu a paciência e enviou ao gabinete uma carta reclamando da descortesia.
Virgílio nega ter criticado Serra. "Foi um documento com informações sobre o Amazonas, para ele gravar um programa de TV. Houve uma dificuldade da minha assessoria com a assessoria dele para marcar um compromisso com evangélicos, o que acabou acontecendo. Não sou muito próximo do Serra, mas ele é o meu candidato e vou trabalhar por ele", disse Virgílio.
Mas o documento de Virgílio virou fofoca no tucanato, como se fosse um exemplo da falta de habilidade de Serra para lidar até com pedidos de companheiros.

Afinidades eletivas
Com aval de FHC, Malan bateu duro em Serra. Na terça, cobrou do candidato "um maior grau de afinidades eletivas com o que este governo veio tentando fazer ao longo dos últimos sete anos".
Tomando emprestado o título do livro "As Afinidades Eletivas", do escritor alemão Johann Wolfgang Goethe (1749-1832), Malan deu uma resposta indireta às críticas que Serra tem feito à política econômica do governo.
Para FHC, Serra exagerou ao defender a volta da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) e ao expressar publicamente discordâncias em relação aos aumentos da gasolina. Na avaliação de FHC, Serra teme perder a segunda posição nas pesquisas para Anthony Garotinho (PSB). O tucano, que tem boa marca nos levantamentos, acha que parou de crescer devido às más notícias na economia.


Texto Anterior: Projeto do PT para energia restringe capital estrangeiro
Próximo Texto: Sem Serra, PFL aceita ceder vice ao PMDB
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.