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NO PLANALTO
Cratera de R$ 350 mi assedia o bolso do contribuinte
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O brasileiro já se habituou às notícias sobre trave$$uras em fundos de pensão
do porte de Previ e Petros, gigantes estatais. Como as que
enredam Ricardo "no limite da
irresponsabilidade" Sérgio, por
exemplo. Sabe-se pouco, porém,
acerca da rotina de fundos nanicos, situados na periferia do
Estado.
Aqui se apresentará um caso
exemplar. Recomenda-se ao
leitor, de saída, que proteja a
algibeira. Estão de olho nela.
Chama-se Cibrius a entidade
de que se falará. É o fundo de
pensão da Conab (Companhia
Nacional de Abastecimento).
Pende das extremidades do organograma do Ministério da
Agricultura.
Ocupa a 129ª posição no ranking dos fundos, incluindo privados e estatais. Ostenta patrimônio de algo como R$ 100 milhões. Sua carteira de investimentos é de R$ 89 milhões. Dinheiro que vira troco quando
confrontado com o buraco
atuarial aberto na contabilidade do fundo: algo como R$ 350
milhões, em valores corrigidos.
Caberá à Conab, como patrocinadora do fundo, cobrir a cratera contábil. Há até decisão judicial nesse sentido. Negocia-se
um acordo de escalonamento
do repasse. Adivinhe de onde
sairá o dinheiro? Sim, isso mesmo, do Tesouro Nacional. Em
português mais claro: do seu
bolso.
O déficit ronda o Cibrius desde 95. Sob Fernando Collor,
fundiram-se três estatais (Cobal, CFP e Cibrazem) em uma
(Conab). O fundo de pensão da
Cibrazem acolheu os funcionários das outras duas. Esqueceu-se, porém, de refazer os cálculos
atuariais, indispensável para
saber se o fundo teria dinheiro
para pagar as aposentadorias
no futuro. Daí o buraco, que
aumenta dia a dia.
Até abril de 99, fingia-se que a
encrenca não existia. Eleita pelos associados do Cibrius, uma
trinca de novos diretores (José
Pereira Rocha, Fernando José
Sales e Evaldo Fernandes de
Oliveira) pôs os números sobre
a mesa. Farejaram-se, de resto,
uma penca de negócio$ da diretoria anterior. Coisa grosseira.
Depois de frangar um elefante sob as pernas, a direção da
Conab, patrocinadora do fundo, encomendou à SPC (Secretaria de Previdência Complementar) uma intervenção no
Cibrius. Foi atendida em dezembro de 2000. Tarde. Muito
tarde. As malfeitorias estavam
consumadas. E os novos diretores traziam as mangas arregaçadas.
Comissão de inquérito instituída pela SPC confirmou a fuzarca que embalou a gestão do
fundo de pensão da Conab até
o início de 99. Aos exemplos:
1) em 26 de maio de 98, o Cibrius comprou um formidável
lote de ações da Teleceará (Telecomunicações do Ceará): 7
milhões de papéis. Gastou R$
1,584 milhão. Revendeu o papelório na bacia das almas um
ano e meio mais tarde. Amargou prejuízo de R$ 1,1 milhão,
em valores da época;
2) em 11 de março de 99, adquiriram-se 4,2 milhões de
ações da Telma (Telecomunicações do Maranhão). A cotação média do papel no mercado
era de R$ 36,36 por lote de mil
ações. Pagou-se R$ 240. No total, foi à fogueira R$ 1,008 milhão. Dali a dois meses, revenderam-se as ações a R$ 29,03 o
milheiro. Prejuízo final: R$
886.511,22, fora a correção;
3) em 22 de março de 99, comprou-se um lote de 120 mil
ações da Cosern (Companhia
de Saneamento do Rio Grande
do Norte). Ao preço de R$ 1,2
milhão. Ou R$ 10 a unidade. Sete meses mais tarde, as ações foram revendidas a R$ 2,40 cada.
E o Cibrius hospedou novo prejuízo: R$ 912 mil, fora a atualização monetária;
4) o fundo celebrou outras nove transações da China entre 99
e 2001. Agasalharam-se de letras financeiras do governo de
Alagoas a debêntures de empresas mal-afamadas. O prejuízo
levado aos balanços, tingidos
de bordô, soma R$ 13,9 milhões.
Noves fora a correção;
5) em 30 de junho de 99, o Cibrius contabilizava lastro de R$
63 milhões para garantir as
aposentadorias de seus associados. Desse total, 34,12%, ou seja,
R$ 21,5 milhões, encontravam-se aplicados em debêntures, espécies de títulos de crédito emitidos por empresas. O dinheiro
azeitou a contabilidade de firmas que iam mal das pernas.
Nada menos que R$ 8,7 milhões
bancaram debêntures do tipo
"subordinada".
O que significa que, quebrando a firma, o Cibrius entra no
final da fila de credores. Outros
R$ 5,013 milhões custearam debêntures da Easypar;
6) a Easypar foi criada para
financiar vendas de carros da
Cantareira Distribuidora de
Veículos, revendedora Ford de
São Paulo. O Cibrius foi o único
"investidor" a se embrenhar na
aventura. Enterrou no negócio
10% de seu patrimônio. Recebeu como "garantia", entre outros micos, R$ 624.800,76 em
CDBs do Banco Seller, liquidado em 94, e R$ 1,3 milhão em letras financeiras de Alagoas. Em
4 de fevereiro de 99, a Cantareira foi à breca. Pediu concordata. Na última vez em que o Cibrius fez as contas, em dezembro de 2000, o prejuízo era de
R$ 7,030 milhões;
Márcio Elison Ferreira dos
Reis e Jeferson de Deus Soares,
ex-dirigentes do Cibrius, foram
inabilitados pela SPC, por quatro anos, para o exercício de
cargos em fundos de pensão, seguradoras e instituições financeiras. Recorrem da decisão.
Durante o inquérito, disseram,
entre outras coisas: a) ao aprovar os balancetes, os conselheiros do Cibrius referendaram a
gestão do fundo; b) eventuais
prejuízos decorrem dos riscos
normais de mercado.
A leniente direção da Conab
foi poupada pela não menos leniente SPC. Quanto ao trio de
dirigentes eleitos do Cibrius,
afastado há quase um ano e
meio, atravessou ileso as investigações. A despeito disso, José
Rocha, Fernando Sales e Evaldo
Oliveira não foram reconduzidos a seus postos. Como têm
mandato até 2003, pediram à
Justiça que anule a intervenção.
Chama-se José da Silva Crespo Filho o interventor. No momento, ele reforma os estatutos
do Cibrius, prepara o terreno
para a posse de novo conselho
deliberativo e negocia a cobertura do buraco de R$ 350 milhões. O contribuinte brasileiro
não perde por esperar. Cedo ou
tarde, a mordida virá. Notícia
desalentadora para quem acaba de entregar a declaração de
Imposto de Renda.
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