São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 2008

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Base aliada tenta votar hoje nova CPMF

Governistas querem alterar projeto da emenda 29, limitando verba adicional para saúde à arrecadação de novo tributo

Proposta é juridicamente controversa: Constituição só permite criação de novos tributos não cumulativos, e contribuição é cumulativa


DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A base governista no Congresso decidiu que apresentará hoje a proposta de criação da CSS (Contribuição Social para a Saúde), nos moldes da extinta CPMF, em uma estratégia para desidratar o projeto que eleva as verbas para o setor.
Segundo os líderes aliados ao Planalto, o novo tributo também incidirá sobre os débitos em conta corrente, com as isenções vigentes na cobrança da contribuição anterior. A alíquota, porém, será de 0,1% -a da CPMF era de 0,38%. Os cerca de R$ 10 bilhões anuais em receita esperada seriam destinados integralmente à saúde.
A proposta, que será feita por projeto de lei complementar, é juridicamente "controversa", como admite o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS). A Constituição só permite criar por esse instrumento tributos não cumulativos -e a CPMF, pelo consenso que vigorava ao menos até ontem, era um tributo cumulativo, ou seja, incidente em todas as etapas do processo produtivo.
"Nós temos avaliações de que a CPMF nunca foi um tributo cumulativo", disse Fontana. A Folha perguntou ao deputado quem havia produzido essas avaliações. "Um grupo de pessoas qualificadas", respondeu, sem citar nomes: "Elas podem se revelar depois, se quiserem".
O plano dos governistas não se limita, porém, ao novo tributo. Pretende-se alterar também a essência do projeto já aprovado pelo Senado que eleva as verbas da saúde dos atuais R$ 50 bilhões para pouco mais de R$ 70 bilhões anuais. Pelo modelo a ser apresentado aos deputados, os recursos adicionais para o setor se limitariam à receita da CSS, se o tributo sobreviver ao Senado e a previsíveis questionamentos na Justiça.
A idéia foi fechada em reunião na tarde de ontem entre o ministro José Gomes Temporão (Saúde), líderes dos partidos aliados e representantes. Horas antes, o ministro já havia defendido que o setor ficasse com a regra atual de financiamento, criada em 2000 pela emenda constitucional 29 -gastos corrigidos anualmente conforme a inflação e o crescimento da economia- e "um plus", correspondente à CSS.
Mais tarde, Fontana e o líder do PT, Maurício Rands (PE), confirmaram que essa seria a proposta alternativa dos governistas para a regulamentação da emenda 29 -o Executivo não assume oficialmente participação na empreitada. Pelo texto, a saúde também seria beneficiada com R$ 1 bilhão de um aumento do IPI sobre os cigarros, mas esses recursos precisam ser repartidos com Estados e municípios.
Líderes da bancada da saúde, uma das mais poderosas do Congresso, protestaram, e a oposição decidiu obstruir as votações na Câmara. "O que eu acho é que o governo não contava com o que o Senado iria fazer e está tentando achar uma solução", disse o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS). O projeto aprovado pelo Senado no início do mês eleva a verba da saúde ao substituir a correção dos recursos pela variação do Produto Interno Bruto por uma vinculação de 10% da receita bruta da União.

Atraso
O texto aprovado pelos senadores criou um constrangimento político para o presidente Lula. Na hipótese de a proposta ser ratificada pela Câmara e sancionada pelo Planalto, poderia ser necessário sacrificar outros áreas do gasto público para cumpri-la; na perspectiva de vetar o aumento de verbas, Lula arcaria com as conseqüências em ano eleitoral.
Com a estratégia definida ontem, o governo tenta condicionar a expansão do gasto à criação de um tributo de legalidade duvidosa. No mínimo, é provável que consiga retardar a aprovação final da regulamentação da emenda 29. Se for modificado pela Câmara, o projeto terá de voltar ao Senado. Se a CSS for aprovada, só começará a ser cobrada 90 dias após a sanção presidencial. (GUSTAVO PATU, MARIA CLARA CABRAL E ANGELA PINHO)


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