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Enfermeira foi torturada em parto
da Reportagem Local
A enfermeira Criméia Alice
Schmidt de Almeida, 53, diz que
o parto de seu único filho foi usado pelos militares como forma
de tortura. O procedimento de
corte e posteriormente de costura de um dos músculos da vagina
para facilitar a passagem de bebês teria sido feito sem anestesia.
""Antes disso fiquei 27 horas
com a bolsa rompida. A criança
poderia ter sofrido insuficiência
respiratória e morrer."
Criméia fez parte da guerrilha
do Araguaia, um grupo de luta
armada organizado pelo PC do B
na fronteira entre Pará, Maranhão e Goiás. Abandonou o local
aos três meses de gravidez.
Presa na casa da irmã, foi confundida com a empregada por
duas semanas. ""Fingia que não
sabia ler e escrever. Assinava
com o polegar. Quando descobriram, apanhamos muito."
Antes da tortura, foi examinada por um médico que recomendou que ela não fosse atingida na
barriga e nos órgãos genitais.
""Os interrogatórios são feitos
com a gente nua. Fingia que estava vestida. Na hora em que é torturada, você só pensa em morrer. E eles lembram que não é para isso acontecer", conta.
Na tentativa de persuadi-la a
falar, os agentes torturaram
diante dela a própria irmã. ""É
muito mal. Você sabe que não
pode falar porque outro apanharia, mas dá angústia. Chegaram a
me propor que rodasse a máquina de choque elétrico. Não fiz. É
uma espécie de jogo para ver
quem resiste mais."
Depois do nascimento de João
Carlos, ameaçaram levá-lo para
a Febem (Fundação Estadual do
Bem-Estar do Menor) ou entregá-lo para ser criado por um militar. ""Ficava apavorada."
O pai da criança, André Grabois Ferreira, foi morto durante
a campanha do exército contra a
guerrilha é está entre os desaparecidos políticos do regime. João
Carlos só veio a conhecê-lo adulto, aos 19 anos, durante a abertura dos arquivos do Dops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social), em 1992.
Solta em 19 de abril de 73, Criméia nunca foi presa legalmente.
""Minha prisão foi um sequestro.
Diziam que havia sido detida para averiguações, mas fui seguida
até 80." Segundo ela, até 1991 há
registros no governo sobre suas
movimentações.
Militante do PT, ela conta que
já votou em Luiz Inácio Lula da
Silva (PT), Mário Covas (PSDB)
e Marta Suplicy (PT).
""Sou marxista e ainda acredito
na luta de classes. Não me arrependo de nada do que fiz, mas
também não perdoei nenhum de
meus torturadores. Eles não são
dignos de perdão."
(PZ)
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