|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TRABALHO INFANTIL
Só em SE cronograma é cumprido
Governo atrasa o
dinheiro de bolsas
MARIO CESAR CARVALHO
da Reportagem Local
O governo federal está atrasando o pagamento das bolsas do
programa de erradicação do trabalho infantil em 8 dos 9 Estados
em que foi implantado. Só em
Sergipe o pagamento está em dia.
O programa é considerado pelo
próprio presidente Fernando
Henrique Cardoso como uma das
mais bem-sucedidas políticas sociais de sua gestão.
O maior atraso ocorre em Rondônia. As 263 famílias do município de Ariquemes, onde crianças
de até 5 anos trabalhavam em
uma mina de cassiterita, não receberam os valores de julho, agosto,
setembro e outubro.
O programa dá uma bolsa, cujo
valor varia de R$ 50 a R$ 12,50, para famílias retirarem seus filhos
de até 14 anos do trabalho e colocá-los na escola. Ele custa R$ 82,7
milhões ao ano ao Ministério da
Previdência e beneficia 130 mil famílias. O valor corresponde a
8,9% dos gastos do governo com
merenda.
Em Pernambuco, Bahia e Mato
Grosso do Sul, o atraso é de dois
meses -o governo não enviou os
recursos de setembro e outubro.
Em Pernambuco, onde está
concentrado o maior número de
famílias beneficiadas pelo programa (63 mil), os meses de junho,
julho e agosto foram pagos de
uma vez, no final de outubro.
"A molecada só não voltou para
os canaviais porque não há trabalho. Há 100 mil trabalhadores das
usinas desempregados", diz Maria Aparecida Pedroza Bezerra,
que coordenou o programa de erradicação no Estado.
Na Bahia, onde o programa retirou crianças que trabalhavam
com sisal e em pedreiras, a bolsa
atinge 30 mil famílias. No Mato
Grosso do Sul são beneficiadas
3.220 famílias cujos filhos trabalhavam em carvoarias.
Volta ao trabalho
O atraso nos pagamentos já
provoca revezes no programa.
Em Ariquemes, município a 360
km de Porto Velho, 15 crianças
chegaram a abandonar a escola e
voltaram ao garimpo.
"As famílias precisam desse dinheiro. As crianças não trabalham porque acham bonito, mas
por necessidade", diz Roseli Cleoni Krueger, presidente da Comissão de Erradicação do Trabalho
Infantil de Ariquemes. Depois, as
crianças foram convencidas a voltar à escola.
Amanhã, a organização não-governamental que articulou as parcerias entre a iniciativa privada e
os três níveis de governo para erradicar o trabalho infantil em Ariquemes receberá um dos principais prêmios de educação do país
-o Prêmio Itaú-Unicef. A ONG
foi criada após reportagem da Folha em 1997.
Em Abaetetuba (PA), a 70 km
de Belém, a morosidade dos pagamentos fez com que o programa produzisse resultados que
tendem a zero.
Lá, a tragédia infantil é o trabalho nas olarias. Dezoito casos de
mutilação já foram registrados.
Uma garota perdeu os dois braços
numa máquina de amassar barro,
chamada maromba. Outra teve o
couro cabeludo e as orelhas arrancados aos 9 anos.
Em 6 de julho deste ano, três
meses depois de os casos terem sido revelados pelo jornal "O Liberal", o ministro Waldeck Ornélas
(Previdência) e o governador Almir Gabriel (PSDB) lançaram o
programa em Abaetetuba. Parecia que era para valer, mas só na
última quarta-feira, com um atraso de três meses, as crianças receberam os meses de agosto e setembro. O valor da bolsa por
criança é de R$ 12,50.
O governo federal faz a seguinte
propaganda para o valor da bolsa:
"R$ 25 para cada dois irmãos".
"Esse valor é ridículo", classifica
André Franzini, coordenador da
Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil em Abaetetuba, onde a bolsa beneficia 1.109 crianças
de 690 famílias. "Quase ninguém
abandonou as olarias", conta o
coordenador.
Segundo Franzini, o valor de R$
12,50 foi estabelecido pelo governo federal a partir de um equívoco. R$ 12,50, diz, é o valor mínimo
que as crianças ganham nas olarias. O valor médio seria de R$ 25.
Só para sair das ilhas onde funcionam as olarias e receber a bolsa
na sede do município, as famílias
gastam R$ 5 com transporte e alimentação. Sobram R$ 7,50. Dá
para comprar 2 kg de carne (de
segunda) e 1 kg de arroz.
Texto Anterior: Congresso do PT: Moderados impedem "Fora FHC" Próximo Texto: Pai de mutilada recusa bolsa de R$ 12,50 Índice
|