|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRIME ORGANIZADO
Medida adotada por FHC extinguiu a punição a fraudadores que pagarem o que sonegaram
Procuradores apontam brechas na lei
da Agência Folha
"A legislação beneficia os fraudadores fiscais". É isso o que pensam quatro procuradores da República ouvidos pela Agência Folha -Mario Luiz Bonsaglia, de
São Paulo, Mário Lúcio Avelar, de
Tocantins, Tranvanvan Feitosa,
do Piauí, e Delson Lyra Fonseca,
de Alagoas.
Eles criticam uma lei assinada
pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em seu primeiro
mandato, a de nº 9.249, de dezembro de 1995, que extinguiu a punição aos fraudadores de notas fiscais que decidam pagar os impostos sonegados à Receita.
Pela lei, alguém que for flagrado
utilizando uma nota fria resolve
seu problema com a Justiça ao pagar o imposto devido.
O prazo para acertar esse tributo é bastante elástico, pois os autores de fraudes se livram de ação
criminal (extinção da imputabilidade) se pagarem o imposto devido antes do acolhimento da denúncia pelo juiz -a investigação
após uma denúncia dura, em geral, de três a quatro anos.
A lei de 1995 substituiu a 8.383,
de dezembro de 91, promulgada
pelo presidente Fernando Collor,
que determinava pena de prisão
de 2 a 5 anos, além de multa, para
quem cometesse irregularidades
no uso ou emissão de notas frias.
"Fica difícil inibir esse tipo de
ilegalidade, porque o crime de sonegação se sobrepõe ao de falsificação e aos outros que abrangem
a emissão de uma nota fria", disse
Avelar. "Sem dúvida, é um incentivo às fraudes", diz Bonsaglia.
Para os advogados Ives Gandra
Martins, especialista em direito
tributário, e José Roberto Batochio, deputado federal (PDT-SP)
e ex-presidente da OAB, a mudança na lei beneficiou o Estado.
"O que interessa ao governo é receber. Se ele conseguir receber,
por que mandar para a prisão
aquele que decide pagar suas dívidas?", questiona Martins.
Para o procurador Avelar, porém, o resultado da nova lei é que,
como os fraudadores sabem que
vão ficar impunes, cometem o
mesmo crime repetidas vezes.
Outros motivos
"A única saída, quando sabemos desse tipo de delito, é procurar outros motivos para processar
o fraudador, como formação de
quadrilha ou falsificação de documentos, o que dificulta o trabalho
dos promotores", disse.
Gandra discorda dessa opinião.
Ele afirmou que, uma vez que a
Receita Federal conhece o fraudador, passa a vigiá-lo, dificultando
muito que haja repetições nas irregularidades.
"De forma alguma deixar de
prender uma pessoa passa a ser
um estímulo ao cometimento de
crimes. O pagamento de uma
multa, por exemplo, com um valor 10, 100 vezes maior ao da nota
fria, já seria uma grande lição",
afirmou Batochio.
Com a lei de Collor, afirmou
Gandra, houve uma grande queda na arrecadação. "O sujeito que
estava devendo não podia pagar o
débito porque, senão, ele poderia
ir para a cadeia", disse.
"Além do mais, hoje, se a Receita percebe que houve dolo na
emissão de uma nota fiscal irregular, a multa pode chegar a 300%
do valor do Imposto de Renda.
Essa é uma punição condizente
com o crime."
O procurador Feitosa, do Piauí,
defende a "prisão imediata" dos
envolvidos em desvio de dinheiro
público e afirma que a falta de rigor da lei propiciou que, com a
municipalização dos recursos federais, crescesse a corrupção nas
prefeituras.
"A extinção da imputabilidade
fomenta a fraude, até porque dá
um prazo extra para as empresas
pagarem as dívidas sem penalidade criminal", afirmou o procurador Fonseca.
Foi com a lei 8.383, de Collor,
que o empresário Paulo César Farias, o PC, acabou tendo decretado seu primeiro pedido de prisão
preventiva, após o impeachment.
Em um artigo publicado em janeiro no "Boletim dos Procuradores da República", Bonsaglia
cita Al Capone como um exemplo
de que, sem a punição prevista em
lei à fraude fiscal, não seria possível prender o mafioso. "O Brasil é
um país onde Al Capone poderia
viver no paraíso."
Texto Anterior: Verbas do Fundef são alvos de fraudes Próximo Texto: Prefeitura é suspeita de desviar R$ 40 mi Índice
|