São Paulo, Domingo, 28 de Novembro de 1999


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CELSO PINTO
Mais tempo para a reforma

Duas reuniões da "comissão tripartite", formada para resolver o impasse da reforma tributária, foram o bastante para convencer o ministro Alcides Tápias, do Desenvolvimento, de que é preciso dar mais tempo para as negociações.
A comissão, teoricamente, deveria tentar um consenso em uma semana. Tápias acha que só com dois ou três meses de prazo isso seria possível.
Tápias assegura que o governo, a começar do presidente Fernando Henrique, quer, sim, que a reforma tributária saia. Admite, contudo, que a tarefa é muito complicada.
A comissão tripartite é formada por 15 membros, divididos igualmente entre governo, comissão do congresso e secretários da Fazenda dos Estados. Nas reuniões de quinta e sexta, ficou claro, segundo Tápias, que os secretários presentes não se sentem à vontade para falar em nome dos outros.
Não só os oito a nove (e não cinco) secretários que compareceram não têm uma posição comum, como reconhecem que não falam pelos outros. Mesmo que se chegue a uma fórmula mágica que contente os cinco (ou nove), outros secretários (e governadores) poderiam votar contra ela. Daí porque Tápias acha que é preciso de mais tempo.
É sabido que uma das motivações para Tápias aceitar o ministério foi poder ajudar na reforma tributária. Ele justifica, contudo, a força da reação da área econômica contra a proposta aprovada pela comissão.
"É algo motivado pela prudência e responsabilidade de quem está no comando", diz. "Não se pode abrir o expediente sem saber quanto se tem no caixa", compara.
O impasse criado, a seu ver, tem um lado positivo. Existe um ônus político potencial para todo mundo envolvido. O governo não quer ser acusado de impedir a aprovação da proposta. A comissão quis levar a decisão para o plenário, mas as lideranças do plenário não querem carregar o ônus de, eventualmente, rejeitar a proposta. Os Estados também não querem ser vistos como a razão do fracasso.
Tápias admite que existe um "teatro do absurdo" nas idas e vindas da discussão da reforma tributária, desde 95. "Mas nós queremos que seja aprovada uma reforma que possa ser praticada", diz.
A comissão tripartite começou os trabalhos discutindo os princípios, em vez de ir ao cerne prático das duas propostas opostas: a do Secretário da Receita Federal e a do relator Mussa Demes. Tápias diz que, em teoria, todos os Estados concordam que a guerra fiscal é danosa, mas muitos querem ter poder para fixar alíquotas.
Hoje existem 27 legislações diferentes para o ICMS e todos concordam, em teoria, que seria bom simplificar. Mas muitos querem ter liberdade para legislar sobre tributos. Quer dizer, nem mesmo sobre princípios gerais pode-se dizer que haja consenso. Tápias alega, de todo modo, que já houve demonstrações de alguma flexibilidade, tanto do lado do governo, quanto do lado da comissão.
A nota da Fazenda arrasou a proposta de Mussa Demes, alegando problemas técnicos insolúveis. Dois técnicos categorizados do governo, Ricardo Varsano, do Ipea, e José Roberto Afonso, do BNDES, ajudaram na proposta de Demes.
A Fazenda defende um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) federal e critica a idéia de dividi-lo em duas partes: uma federal, outra estadual. Um técnico lembra que trabalhos recentes, como o do economista Richard Bird, que foi do FMI, defendem o imposto dual, por seguir duas tendências modernas: descentraliza e exige responsabilidade fiscal dos Estados.
A idéia é que, se os Estados não se envolvem na cobrança, mas apenas têm acesso à repartição de um fundo federal, se responsabiliza menos por ele. Além disso, se existe uma crise localizada num Estado, ou na União, não se pode tentar atendê-la elevando apenas a alíquota específica: todos teriam que pagar a conta.
A Receita alega que a proposta de Mussa propõe 16 alíquotas que podem virar 100, se os Estados usarem a margem de aumento prevista. O técnico rebate dizendo que a proposta só tem 4 alíquotas: básica, ampliada, reduzida e cesta básica, nos moldes de outros países europeus. Se houver uma só alíquota, lembra, alimentos básicos, por exemplo, terão que pagar um enorme e injusto imposto.
A Fazenda diz que o sistema de compensação da proposta de Demes é impraticável. O técnico lembra que 90% das empresas usam o sistema do Simples e, portanto, não têm imposto a compensar.
Para as que estão fora, o tamanho do crédito fiscal pode ser pequeno, se o valor adicionado no produto comprado for grande. Além disso, a compensação seria mais simples e automática pelo fato de o imposto interestadual ser federal.
Em suma, dos princípios à operação, tudo é polêmico na reforma tributária, o que relativiza qualquer otimismo.


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