São Paulo, segunda-feira, 28 de novembro de 2005

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DIPLOMACIA

Permissão para morar no país vizinho deve ser a primeira medida

Brasil e Argentina buscam corrigir erros e se integrar

Ubirajara Dettmar/Folha Imagem
Os então presidentes Raúl Alfonsín (à esq.) e José Sarney conversam em 1985, em Foz do Iguaçu


CLÁUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

FLÁVIA MARREIRO
DE BUENOS AIRES

Vinte anos depois de assinado o primeiro acordo de integração entre o Brasil e a Argentina, os dois países decidiram criar as condições para uma etapa básica em um processo de integração: autorizar a residência de cidadãos do país vizinho. Os atuais governos querem que o Mercosul assuma um caráter mais político, e não apenas comercial.
O Brasil propôs até um acordo de igualdade política que, quando aprovado, vai permitir que um argentino se candidate em eleições no Brasil e vice-versa, que cidadãos argentinos e brasileiros possam votar no país vizinho ou que o partido peronista, por exemplo, abra uma filial no Brasil ou o PT um comitê em Buenos Aires.
Assustados com a proposta, que partiu do secretário-geral do Itamaraty, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, os argentinos pediram mais tempo, mas querem avançar em outros aspectos da integração política, como estabelecer direitos sociais para quem vive na fronteira.
Na quarta-feira, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nestor Kirchner vão se encontrar em Puerto Iguazú, na Argentina, para assinar esse e outros acordos e tentar retomar o projeto da chamada parceria estratégica, estabelecida na Ata de Foz do Iguaçu, assinada pelos ex-presidentes José Sarney e Raúl Alfonsín em 30 de novembro de 1985.
O documento foi o embrião do Mercosul e encerrou anos de hostilidade e até ameaças de conflito armado entre os dois países. O objetivo por trás da idéia de repetir o encontro, conhecido como Dia da Amizade Brasil-Argentina, é tentar corrigir erros que as atuais administrações acreditam que foram cometidos em 20 anos.
Para integrantes das chancelarias e especialistas, um dos erros foi incluir o Uruguai e o Paraguai no Mercosul antes de consolidar a união Brasil-Argentina. Com isso, o bloco abandonou os objetivos políticos originais para tornar-se um projeto mercantilista.
"Primeiro tínhamos que ter consolidado a integração Brasil-Argentina. Depois, à medida que iam sendo preparados, os países menores poderiam aderir ao cumprir requisitos básicos, como acontece na União Européia. Com a entrada do Uruguai e do Paraguai, ficou difícil aprovar os acordos para aprofundar a integração porque esses países têm mais dificuldades", disse o agora senador José Sarney (PMDB-AP). Segundo o Itamaraty e a chancelaria argentina, a idéia não é excluir os sócios menores, mas tornar bilaterais os documentos que não estão sendo implementados por falta de aprovação no Uruguai e no Paraguai. É o caso do acordo de residentes, que prevê que um cidadão argentino deixe de ser tratado como qualquer estrangeiro e vice-versa.
Um outro acordo, parado por resistência do Paraguai, permitirá a cidadãos que moram em municípios de fronteira trabalhar e estudar do outro lado.
Segundo Sarney, a idéia de incluir os sócios menores foi do ex-presidente Carlos Menem, em 1990. Já com a idéia de adotar as políticas neoliberais que vieram em seguida, ele propôs que o Mercosul fosse um projeto comercial.
Para o economista argentino Fernando Porta, Paraguai e Uruguai eram sócios naturais e foram incorporados no momento certo. O problema, diz ele, foi não criar mecanismos específicos para a inclusão do sócios menores. "A circulação de cidadãos já devia existir. É ridículo que uma pessoa, quando volta da Argentina ou vice-versa, tenha que preencher papéis para declarar o que está trazendo", diz o cientista político Luís Alberto Moniz Bandeira, autor de livros sobre integração.
Segundo ele, o projeto inicial previa uma união bilateral setorial, ou seja, que unisse as cadeias produtivas dos dois países para evitar as atuais brigas comerciais; gradativo e administrado, o que significa um mecanismo para ajustar a balança comercial do país que tivesse déficit.
Esse é o maior problema entre Brasil e Argentina atualmente. O ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna, insiste em criar uma mecanismo automático para barrar as importações brasileiras quando supostamente há excessos. Mas o Brasil não concorda. Depois de um ano de discussão, os dois governos chegaram a um meio termo que será anunciado em Puerto Iguazú.

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