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Papel dos EUA afirma que Brasil autorizou seqüestro
Telegrama é indício do envolvimento no desaparecimento de ítalo-argentinos no Rio
Dupla foi presa no Galeão
em 1980; documento está
no processo italiano sobre
ação de brasileiros dentro
da Operação Condor
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Um telegrama enviado ao
Departamento de Estado dos
EUA pela embaixada americana em Buenos Aires em abril de
1980 é um indício do envolvimento de brasileiros no desaparecimento de dois guerrilheiros argentinos no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro,
em março de 1980. Horacio
Campiglia, 31, e Mónica Binstock foram vistos pela última
vez, meses depois, numa prisão
militar nos arredores da capital
argentina.
O documento foi incluído no
processo da Justiça italiana que
resultou nas ordens de captura
internacional emitidas nesta
semana contra pelo menos 11
militares e policiais brasileiros.
Campiglia era ítalo-argentino.
Liberado pela lei americana
de liberdade de informação, o
telegrama confidencial foi entregue à Itália pelo ativista Jair
Krischke, presidente do Movimento de Justiça e Direitos
Humanos do Rio Grande do Sul
e testemunha no processo.
O telegrama narra o encontro de um funcionário da embaixada americana com "membro do serviço de inteligência
argentino" que teria falado sob
condição "estrita de confidencialidade". A fonte teria relatado a montagem de uma operação, com autorização do Brasil,
para prender Campiglia e Mónica quando chegassem ao Rio.
Campiglia, segundo a fonte,
era um nome importante
("quarto ou quinto na estrutura") da maior organização guerrilheira da Argentina, os Montoneros, grupo responsável por
uma série de atentados, seqüestros e mortes de militares
ao longo da ditadura argentina
(1976-1983). Segundo a fonte
argentina, Campiglia continuava comandando, no México,
operações de guerrilha.
"Eles [guerrilheiros] resolveram voltar à Argentina no contexto de uma contra-ofensiva
montonera. Queriam reunir todos os montoneros que estavam fora, voltar e derrubar a ditadura", disse Krischke.
Alertados supostamente por
agentes infiltrados, os militares
argentinos passaram a prender
e interrogar os montoneros que
tentavam regressar. Muitos foram assassinados.
Nos casos de Campiglia e
Mónica, segundo o documento
dos EUA, a fonte argentina disse que a inteligência militar
"contatou sua contraparte da
inteligência militar brasileira
para obter a permissão para
conduzir uma operação no
Rio". Segundo o documento,
"os brasileiros garantiram sua
permissão e uma equipe especial argentina" foi enviada num
avião C130. Os argentinos teriam capturado os dois montoneros e regressado a Buenos Aires no mesmo avião. Os militares argentinos teriam também
falsificado a hospedagem dos
dois presos num hotel do Rio,
para dar a impressão de que
eles tinham sumido no Brasil.
A fonte argentina relata que
ambos estavam, em abril de
1980, na prisão militar de Campo de Maio, em Buenos Aires.
O relato do telegrama é corroborado em parte por uma
testemunha já ouvida pela Justiça italiana. A ex-guerrilheira
Silvia Tolchinsky informou ter
se encontrado no Campo de
Maio com Campiglia e Mónica.
Um ex-preso, Víctor Basterra, também declarou, em processo na Justiça argentina, que
avistou Campiglia e Mónica no
Campo de Maio "por volta do
Natal de 1980". Segundo Jair
Krischke, há indícios de que
ambos foram assassinados
num dos "vôos da morte" -arremessados ao mar de um helicóptero ou avião.
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