São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 2001

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Protestos ganham as manchetes, mas não a agenda

DO ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

O Fórum Econômico Mundial organizou 311 sessões de debate para seu encontro anual de 2001 tratando principalmente de temas que ocupam a atenção da mídia planetária.
Trouxe a Davos, como de hábito, chefes de governo, como o primeiro-ministro do Japão, Yoshiro Mori. Ou uma das mais novas atrações da mídia, o mexicano Vicente Fox, que acaba de derrotar um partido que estava no poder havia 70 anos, mais que Fidel Castro ou os comunistas da Coréia do Norte. Sem falar de empresários que são sempre notícia, como Bill Gates, da Microsoft.
Com tudo isso, nem o jornal editado pelo próprio Fórum (o "Forum News Daily") conseguiu escapar ontem de uma manchete que tratava dos protestos contra o Fórum, não de suas atividades ("Protestos frustrados pelas forças suíças em Davos").
"Frustrados" talvez não seja a palavra correta. Se conseguem a atenção da mídia, um de seus objetivos centrais, não se pode dizer que os manifestantes tenham sido frustrados.
E a atenção da mídia foi visível em todos os telejornais da Europa e de redes como BBC e CNN.
Mas a questão mais relevante é outra: os protestos podem capturar a agenda da mídia, mas influem de fato na agenda de governos e entidades internacionais?
"Os políticos e as entidades estão ouvindo cuidadosamente o que diz o movimento de protesto", responde o senador norte-americano John Kerry (democrata de Massachusetts).
"Prova-o o fato de este Fórum ter incluído muitas sessões sobre Terceiro Mundo, desenvolvimento, contragolpe à globalização", acrescenta Kerry.
Há quem aponte coisas mais concretas do que "ouvir cuidadosamente".
O sindicalista norte-americano John Sweeney lembra que uma campanha liderada pela ONG "Jubilee-2000" (das igrejas protestantes) conseguiu um programa objetivo de redução da dívida dos países mais pobres (é verdade que o programa está apenas no início de sua execução).
Charles Holliday Jr., presidente e executivo-chefe da multinacional Dupont, conta que, pelo menos no plano microeconômico, as ONGs estão conseguindo influir.
Diz que, sempre que sua companhia vai lançar um novo negócio, convida dez líderes de ONGs para que cada um apresente três idéias sobre como o projeto poderia atender suas inquietações, sejam quais forem.
Depois, a Dupont reúne o mundo de negócios com as ONGs e, das reuniões, "saem idéias melhores do que jamais imagináramos", conta Holliday.
Parece, de todo modo, muito pouco, se se considerar a dimensão que os protestos ganharam desde que incendiaram Seattle, em dezembro de 1999, durante a Conferência Ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio).
É em parte fácil explicar por que o movimento de protesto consegue mais atenção da mídia do que resultados efetivos na aceitação de suas propostas: os protestos, em especial os violentos, são, obviamente, um espetáculo para a TV. As propostas, não.
Outro pedaço de explicação está na divergência de avaliações. A ativista indiana Vandana Shiva, por exemplo, cobra "liberdade e flexibilidade" para que os governos nacionais possam executar políticas que atendam às inquietações das ONGs. Pressupõe, portanto, que são os constrangimentos internacionais que bloqueiam a ação dos governos locais.
Já James Wolfensohn, presidente do Banco Mundial, vai na direção contrária: culpa a falta de apoio político interno pelo fato de os governos estarem sendo incapazes de, por exemplo, chegar a um acordo internacional para combater o aquecimento global, uma das causas mais caras às ONGs ambientais.
Divergências à parte, parece difícil discordar de Shiva quando ela diz que, à falta de diálogo e de soluções, o que se vai ver "é uma ordem cada vez mais violenta, como demonstrado nas ruas de Davos". (CLÓVIS ROSSI)



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