São Paulo, Quinta-feira, 29 de Abril de 1999
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JANIO DE FREITAS
Na boca da mina

Com a introdução, entre os temas da CPI, das bilionárias compras de dólares nos dois dias anteriores à sua valorização, pela desvalorização do real, chega-se, de fato, ao vazamento gigantesco e constante de informações antecipadas, ou privilegiadas, sobre decisões financeiras a serem tomadas pelo governo.
Confundido por jornalistas e senadores esse gênero da corrupção brasileira, o caso Marka/FonteCindam/Chico Lopes foi, na verdade, um negócio, feito com dinheiro do Banco Central, para evitar que dois tamboretes de especulação tivessem prejuízo por jogadas ruins no cassino financeiro.
Forçada pelo deputado Aloizio Mercadante, assim como a própria CPI dos Bancos decorreu de denúncia sua, a investigação de informações privilegiadas é das mais necessárias ao Brasil, senão a mais, e só os primeiros dados postos à disposição da CPI já indicam a gravidade do problema.
Apenas na véspera da desvalorização do real, ao que já constatou Mercadante, houve, na Bolsa de Mercadorias e Futuros, US$ 1,8 bilhão em compras de dólares cuja identificação, seja dos negócios pessoais como dos empresariais, é o caminho para a comprovação de relações e conexões entre as origens de informações privilegiadas e os seus utilizadores.
O assunto é explosivo. Mesmo que limitada a um início de abordagem, portanto, a CPI já prestaria o serviço de entreabrir-lhe a porta. Mas isso depende de que os governistas da CPI sejam forçados por contingências incontroláveis. E, a julgar pelo abafamento, nos meios de comunicação, das últimas revelações de Mercadante, os governistas não precisam prever dificuldades. Nem, muitos menos, os corretores, filhos de corretores, amigos de corretores, sócios encobertos de corretoras.

FHTur
A nova moralidade do pessoal de governo -a grande ou única reforma produzida nestes anos neoliberais- ainda não está assimilada aqui fora, a não ser nas atividades e locais combatidos pela polícia.
Dois exemplos recentes começam pelo desvio de R$ 1,7 bilhão do Banco Central para favorecer o Marka e o FonteCindam: ""(...) A investigação não se justifica, porque pode ter havido um erro (na ""ajuda"), mas não foi de má-fé". E sobre o uso de avião da FAB por Clóvis Carvalho e companhias, para turismo de Carnaval em Fernando de Noronha: ele ""errou ao usar o avião, mas corrigiu o erro pagando (R$ 25 mil) aos cofres públicos". Não é preciso identificar o autor dessas frases impudentes.
Restam algumas dúvidas, porém. O pagamento equivale a um fretamento por Clóvis Carvalho, logo, aviões da FAB são fretáveis? Com que fundamento? E que critérios fixaram o preço para o serviço tão especial? Onde nós outros podemos contratar os mesmos serviços, já que basta pagá-los aos cofres públicos por tarifa evidentemente modesta? São perguntas, só, porque os serviços da FHTur, como José Simão denomina a agência Planalto, não são para gente respeitável.
O abuso de prevaricação que no governo de Fernando Henrique Cardoso se resolve com um cheque (e o que, nele, não se resolve com cheque?) resultaria, em um governo que fosse indecente, mas não fosse cínico, pelo menos no afastamento do prevaricador. No caso, aliás, reincidente.
Mas a submissão silenciosa da FAB também não é assimilável cá fora.


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