São Paulo, Terça-feira, 29 de Junho de 1999
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CELSO PINTO
O câmbio e a inflação

Cada desvalorização do real frente ao dólar de 10% produz uma inflação de 0,5% a curto prazo, ou seja, de um a três meses. Se a desvalorização persistir durante um ano, o impacto sobre a inflação será de 2% a 2,5%.
Essa é a conclusão de um estudo feito pelo diretor do Banco Central Sérgio Werlang e o professor da PUC Ilan Goldfajn. Não é apenas acadêmica. Procura responder uma das questões mais importantes e menos conhecidas, que ajudarão a embasar o sistema de "metas inflacionárias", que começa a vigorar na quinta-feira.
O Ministério da Fazenda vai anunciar, hoje ou amanhã, metas anuais de inflação até 2001 e uma faixa aceitável de flutuação. Ao Banco Central caberá manter a inflação dentro desse intervalo, usando basicamente a política de juros como instrumento.
Para saber como a inflação vai se comportar, o BC vai usar dois modelos macroeconômicos, com seis equações. Outros oito modelos estatísticos servirão de apoio adicional, para checar a coerência da trajetória prevista nos modelos macro, num período de até seis meses.
O coração do sistema estará na combinação entre o que dirão os modelos macro, temperados pelo julgamento subjetivo dos membros do Conselho de Política Monetária, o Copom, explicou Werlang, ontem, em São Paulo. Esses modelos macro vão considerar variáveis de demanda agregada, de oferta agregada e uma equação para o câmbio.
Os modelos têm uma certa precariedade. Werlang admite que, "no início, será mais arte do que ciência". Isso vale, principalmente, para a avaliação do impacto do câmbio sobre a inflação. Por uma razão simples: a experiência do país com câmbio flutuante tem exatos cinco meses.
Werlang diz que muitos países enfrentaram o mesmo problema: saíram de sistemas de câmbio controlado para câmbio flutuante e começaram a usar as metas inflacionárias. Com o tempo, os modelos se refinaram.
No caso do câmbio, o trabalho de Werlang e Goldfajn servirá como indicador inicial. É importante, porque o Brasil ainda depende de muitos capitais externos para fechar suas contas e vai continuar dependendo durante algum tempo. Portanto, mudanças externas como o aumento dos juros americanos, a desvalorização da Colômbia, a ameaça de moratória do Equador ou de crise na Argentina podem afetar o fluxo de capitais e levar a oscilações fortes no câmbio.
Por definição, no sistema de metas inflacionárias o BC não vai defender uma taxa de câmbio: vai se preocupar, apenas, com a inflação. No entanto, o câmbio tem um impacto inflacionário. Uma desvalorização muito forte poderia levar o BC a subir os juros, não para tentar baixar o câmbio, mas para impedir que suba a inflação.
Werlang acha que esse impacto de curto prazo, de 0,5% para cada 10% de desvalorização, é pequeno e administrável. Os modelos, por sua vez, vão embutir os impactos de "choques" conhecidos, de crises externas a um não cumprimento de meta fiscal. O modelo não será revelado, mas relatórios trimestrais, a começar do que será divulgado amanhã, justificarão as previsões do BC.
Um problema não resolvido vem do acordo com o FMI. Quando um BC persegue uma meta inflacionária, ele não está preocupado com quanto cresce a moeda, mas apenas com o objetivo final dos preços. O acordo com o FMI, contudo, continuará tendo uma meta para o crédito doméstico líquido (CDL) para esse terceiro trimestre, confirmou Werlang.
O CDL mede a expansão da base monetária menos a variação das reservas. Serve para o FMI garantir, indiretamente, uma meta para as reservas. Teoricamente, o BC pode ter sucesso na meta inflacionária e não cumprir a meta do CDL. Se isso acontecer, vai gerar uma confusão injusta e inútil, apenas porque o CDL é um critério de performance do acordo.
Werlang acena com a hipótese de talvez esse conflito absurdo sumir nas metas para o quarto trimestre. O acordo com o Brasil é o primeiro assinado pelo FMI que incorpora o sistema de meta inflacionária. "Há 53 anos o FMI usa o mesmo método e é difícil mudar", diz Werlang. Fica o CDL, mas a meta deve ser ampla o suficiente para não dar zebra. Quarta-feira, o BC vai divulgar suas previsões para a inflação e as previsões do mercado. As do mercado, de sexta-feira passada, estão num "paper" do BC. Para 99: IGP de 11,9%; IGP-M de 11,9%; IPC-Fipe de 6,35% e INPC de 7,5%. Para o ano 2000: IGP de 6,2%; IGP-M de 5%; IPC-Fipe de 4,45% e INPC de 5%. Para o mês de junho: IGP de 0,5%; IGP-M de 0,35%; IPC-Fipe de 0,18% e INPC de 0,35%.



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