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REGIME MILITAR
Desde agosto do ano passado, comissão julgou apenas 597 processos
Mais de 11 mil pedidos de anistia aguardam decisão
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Noite de 4 de abril de 1968. Ronaldo Duarte Guimarães recebe
uma venda nos olhos e fica de costas para uma parede. Um destacamento do Exército marcha à sua
frente, e um oficial dá as ordens:
preparar, apontar, fogo. Vítima
de uma simulação de fuzilamento, o engenheiro espera há cerca
de dez meses uma resposta da Comissão de Anistia, do Ministério
da Justiça, para o pedido de indenização por danos sofridos durante o regime militar.
Guimarães faz parte do grupo
de 11.094 pessoas que esperam o
julgamento de seu processo pela
comissão. Preso e torturado,
aguarda que a comissão consiga
tempo e pessoal para dar conta do
volume de trabalho. Um sinal do
atraso: o "Diário Oficial" da
União publicou no dia 15 as primeiras autorizações desde que o
ministro Paulo de Tarso Ramos
Ribeiro (Justiça) assumiu a pasta,
em julho deste ano.
A Folha apurou que tanto o ministério como o Planalto temem a
ocorrência de um "trem da alegria" nas anistias. O governo age
com cautela no julgamento dos
casos porque não há teto para o
pagamento de salários retroativos
ao período em que a pessoa ficou
sem exercer a função por causa do
regime militar.
"Minha vida foi interrompida
há 38 anos, e até hoje não há nenhum traço de continuidade",
afirma Ronaldo Duarte Guimarães. Demitido da Petrobras, em
1968, por ação da Comissão Geral
de Investigação, ele foi preso após
a missa de sétimo dia do estudante Edson Luiz, assassinado no bar
Calabouço, no Rio de Janeiro.
Guimarães atuou como assistente
de produção de Macunaíma, de
Glauber Rocha.
Equipe
O trabalho de análise dos pedidos de indenização é feito por
uma equipe de quatro consultores jurídicos e dez advogados conselheiros. E é dividido em três câmaras temáticas. A primeira é responsável por julgar os pedidos de
servidores públicos e de quem
não trabalhava para o governo.
A segunda, por casos como o de
Guimarães, de quem tinha emprego na administração indireta,
autarquias ou empresas de economia mista. Cabe à terceira câmara a análise dos requerimentos
feitos por militares prejudicados
pelo regime militar.
A anistia foi assegurada na
Constituição de 1988, mas somente em 2001 foi regulamentada, por
meio de medida provisória.
Os trabalhos da comissão foram
iniciados em agosto daquele ano
e, até hoje, julgou apenas 597 processos, seguindo uma média de 50
pedidos para cada reunião quinzenal das câmaras.
Nesse ritmo, quem preencher o
requerimento neste mês só terá o
pleito analisado em janeiro de
2006. Segundo uma previsão do
Ministério da Justiça, cerca de 40
mil pessoas devem entrar com pedido de anistia. Além dos processos protocolados que estão parados, há outros 1.182 pedidos que
nem sequer foram examinados
preliminarmente.
Quem teve o direito assegurado
pela comissão ainda viu parte do
dinheiro tomado pela Receita Federal em forma pagamento de
Imposto de Renda. A prática contraria o texto da medida provisória que criou a comissão. O recolhimento é feito com base em ofício do Fisco.
Os anistiados também precisam
esperar a máquina estatal por longos meses. O pagamento não é
imediato. A comissão não possui
estimativa sobre a demora, mas
ao menos um caso apurado pela
Folha mostra que o beneficiado
aguardou dez meses entre o deferimento do processo e o recebimento do dinheiro.
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