São Paulo, terça-feira, 29 de outubro de 2002

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Lula prioriza fome, descarta "mágica" e acena ao mercado

Juca Varella/Folha Imagem
O presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado de sua mulher, Marisa, conversa com José Dirceu, presidente do PT



  Petista anuncia Secretaria de Emergência Social contra a fome

  "Vamos promover um pacto nacional pelo Brasil", promete

  Presidente eleito reitera que vai cumprir contratos



DA REPORTAGEM LOCAL

O primeiro pronunciamento oficial do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 57, reproduziu a mesma ambiguidade de sua campanha, marcada, por um lado, pela necessidade do resgate de uma dívida social histórica e, por outro, pela preservação de compromissos econômicos herdados do governo Fernando Henrique Cardoso.
De maneira genérica, Lula procurou conciliar demandas sociais encarnadas em sua candidatura e expectativas do mercado. Anunciou a criação da Secretaria de Emergência Social e disse que seu primeiro ano de mandato terá o "selo do combate à fome". Mais adiante, reiterou seu compromisso com a estabilidade da moeda, o cumprimento de contratos e a responsabilidade fiscal.
Lula iniciou sua fala afirmando que o "Brasil votou para mudar" e que "a esperança venceu o medo" e de caracterizar o PT como um "partido de esquerda", Lula disse que "não há solução milagrosa para tamanha dívida social".
Intitulado "Compromisso com a Mudança", o pronunciamento mesclou mensagens esperançosas - "sinto que um novo Brasil está nascendo" e "não vou decepcionar o povo brasileiro" - com alertas. Disse que nada se resolve com "passes de mágica" e rejeitou rupturas bruscas.
O oposicionista eleito saudou o comportamento "equilibrado" durante as eleições do presidente Fernando Henrique Cardoso e da Justiça Eleitoral.
O texto do pronunciamento era curto -três páginas, com 1.939 palavras- e foi escrito anteontem em conjunto pelos coordenadores da campanha petista, liderados pelo presidente nacional da legenda, José Dirceu, e revisto pelo presidente eleito pouco antes da hora marcada para sua leitura.
Lula iniciou sua fala com uma hora e 40 minutos de atraso, no hotel Intercontinental, nos Jardins, região nobre de São Paulo.
Descontraído, antes de iniciar seu discurso, Lula lembrou de que precisaria de usar óculos para lê-lo, mas que não o faria em razão dos fotógrafos. Em um dos momentos mais críticos do texto, em que falava da "dura travessia" que será seu governo e defendia o "combate implacável ao narcotráfico", interrompeu a leitura e fez gracejos: "O protocolo não colocou água no meu copo", disse, provocando risos. "Não preciso ser tão sério assim", comentou.
Lula citou num mesmo parágrafo de seu pronunciamento a Bíblia e o escritor russo Fiodor M. Dostoiévski (1821-1881) ao falar da obra de companheiros petistas mortos: "É fonte de inspiração para nós que seguimos travando o bom combate. O combate em favor dos excluídos e dos discriminados. O combate em favor dos desamparados, dos humilhados e dos ofendidos".
O "bom combate" é uma expressão da "Primeira Epístola a Timóteo" e "Humilhados e Ofendidos" é o título de uma obra de Dostoiévski que tem como fundo a desagregação social e econômica da Rússia no final do século 19.
Concluiu com celebração àqueles que dividiram com ele o que chamou de "momentos difíceis" do passado: "Todos aqueles que não desertaram do nosso sonho".



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