São Paulo, terça-feira, 29 de outubro de 2002

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NO AR

Reavaliação

NELSON DE SÁ
EDITOR DA ILUSTRADA

Vitória do PSDB, bradaram manchetes de telejornal e algumas comentaristas. A desculpa foi que os tucanos levaram sete Estados.
Antes tinham sete também, mas "cresceu a importância", disse Geraldo Alckmin. Pode ser, mas cantar vitória do PSDB não passa de vício dos oito anos de dominação tucana.
Afinal, o que diferencia o poder do presidente do poder de sete governadores?
Em primeiro lugar, o presidente eleito dá entrevista ao vivo ao Jornal Nacional, que manda seu âncora a São Paulo. O presidente eleito dá até o "boa noite" do JN no lugar de William Bonner, como fez Lula.
Já um governador não vai além do telejornal local, como fez Alckmin.
Por outro lado, o presidente é eleito e, coincidência, no dia seguinte a Globopar "anuncia reavaliação da sua estrutura de capital".
Uma "reavaliação" que só vai terminar depois de empossado o novo presidente.
 
O que diferenciou a entrevista de Lula ao JN da entrevista de Lula ao Fantástico, no domingo, foi que a Globo pelo menos se conteve.
Fez o petista ver e comentar cenas editadas, mas não eram sentimentais. Eram patrióticas ou de campanha.
Mas fez novamente o petista entrar no palco, cumprimentar Bonner; depois, no final, até abraçar Bonner.
Enfim, foi uma simbiose entre o presidente eleito e o oligopólio, mais uma vez, mas não chegou a ser uma obscenidade. Foram mantidas as aparências.
 
Lula chega ao poder, mas sob controle. Dá entrevistas só à Globo, genéricas, e passa as mensagens mais específicas em pronunciamentos escritos ou anotados.
No pronunciamento de domingo, afirmou que vai presidir para o Brasil, não para o PT e seus aliados. No de ontem, apontou, como já dizia José Dirceu na noite da eleição, que seu governo deverá começar pelo "pé esquerdo":
- Meu primeiro ano terá o selo do combate à fome.
De resto, ele vai cumprir contratos, incentivar o mercado de capitais, encaminhar projetos de reforma tributária e outras para o Congresso.
Mas vai começar pelo combate à fome. Será o "selo", sua marca no ano. Para deixar alguma, por menor que pareça, que não seja a da mesmice.
 
Boris Casoy disse que FHC encaminhou uma transição em que, derrotado, parece vitorioso. O presidente também vê assim. Até sai dizendo:
- Há um significado especial em passar para um líder operário. Isso, a mim, pessoalmente, me dá emoção. Espero com ansiedade o momento em que o mundo vai ver a faixa transmitida a um operário.
Mas FHC não passou meses falando do despreparo de Lula?
- Estou muito feliz de ter podido presidir o Brasil num momento em que realiza essas eleições que têm outro significado. O presidente eleito veio de origem humilde. Isso nos deixa orgulhosos.
Mas o candidato de FHC não era José Serra?
- O próprio candidato declarou que não era candidato do governo.
Mais um pouco e ele diria que votou em Lula.


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