São Paulo, sexta-feira, 29 de dezembro de 2000

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OITO ANOS DEPOIS

Termina amanhã pena imposta por Senado a ex-presidente, que está afastado de companheiros de governo

Collor volta sem "República das Alagoas"

Flávio Florido/Folha Imagem
O ex-presidente Fernando Collor de Mello, na sede do jornal da família, na véspera da festa que comemorará o fim de sua punião


LUCAS FIGUEIREDO
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-presidente Fernando Collor de Mello, 51, reconquistará, amanhã, o direito de ocupar cargos públicos, depois de cumprir os oito anos de "exílio político" imposto pelo Senado em 30 de dezembro de 1992.
No seu retorno -possivelmente, com uma candidatura pelo Senado em 2002, pelo Estado de Alagoas-, Collor estará afastado dos principais colaboradores que o acompanharam na trajetória rumo ao Planalto, em 1989, e que no seu governo foram batizados de integrantes da "República das Alagoas".
Da antiga e numerosa trupe de Collor, só cinco nomes continuam próximos ao ex-presidente. Dois deles, são amigos desde os tempos de juventude: o senador cassado Luiz Estevão e o deputado e empresário Paulo Octávio.
Outros dois são os empresários Pedro Paulo Leoni Ramos (ex-secretário de Assuntos Estratégicos) e João Santana (ex-ministro da Infra-Estrutura). Ambos chegaram a auxiliar Collor na frustrada campanha para a Prefeitura de São Paulo neste ano.
Atualmente morando em Miami (EUA), o ex-chefe da Casa Civil do governo Collor, Marcos Coimbra, mantém uma relação amistosa com o ex-presidente, de quem é cunhado.
Em 1989, Collor foi eleito presidente pelo minúsculo PRN (Partido da Reconstrução Nacional) aos 40 anos, depois de exercer mandatos de prefeito indicado de Maceió, deputado federal e governador eleito de Alagoas.
Dois anos depois, surgiram as primeiras denúncias de irregularidades envolvendo o nome de Collor e do seu tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, o PC.
Em junho 1992, foi instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar acusação de tráfico de influência no governo Collor, batizado de Esquema PC.
A CPI concluiu seus trabalhos recomendando a abertura do processo de impeachment. Em outubro daquele ano, o processo foi iniciado, e Collor foi afastado do cargo, sendo substituído pelo seu vice, Itamar Franco.
Em sessão concluída na madrugada do dia 30 de dezembro de 1992, o Senado condenou Collor a ficar oito anos sem exercer funções públicas. O ex-presidente, que havia renunciado um dia antes, não teve os direitos políticos plenamente cassados porque manteve o direito de votar.
Depois do processo de impeachment, Collor mudou-se para Miami, nos EUA, onde comprou uma casa de dois andares e carros importados. Dizia pagar suas despesas com uma retirada de R$ 100 mil das empresas de sua família em Maceió (jornal, rádio, TV e gráfica).
Apresentou-se nas disputas pela Presidência da República (1998) e pela Prefeitura de São Paulo (2000), mas teve a candidatura impugnada pela Justiça por não ter concluído a pena imposta pelo Senado.
Collor livrou-se, até agora, de todas as acusações que lhe foram feitas na Justiça. Na principal delas, em 1994, o Supremo Tribunal Federal arquivou, por 5 votos a 3, uma ação penal que o acusava de corrupção passiva.
Sorte diferente teve Rosane Collor, mulher do ex-presidente. Em agosto deste ano, ela foi condenada a 11 anos e quatro meses de prisão pelos crimes de peculato e corrupção passiva, quando exercia a presidência da LBA (Legião Brasileira de Assistência). Rosane está recorrendo da sentença.

PC Farias e aliados
Dentre os principais colaboradores do ex-presidente, PC Farias teve o final mais trágico. Em 1993, com sua prisão decretada, fugiu do país. Foi capturado na Tailândia e passou mais de um ano na prisão, em Brasília e Alagoas. Em junho de 1996, seis meses após ser solto, foi assassinado em circunstâncias não totalmente esclarecidas até hoje.
Jorge Bandeira, ex-piloto e ex-sócio de Paulo César, também passou uma temporada na cadeia. Agora, dedica-se a administrar um restaurante de cozinha franco-italiana em Maceió, aberto em sociedade com um parente.
Rosinete Melanias, ex-secretária de PC, também voltou para a capital alagoana depois de cumprir alguns meses de prisão. Tenta se estabelecer como pequena empresária no ramo de confecções.
Alguns parceiros do ex-presidente estão sendo alvos de ações na Justiça ou enfrentam problemas pessoais.
Com dificuldades financeiras, o ex-secretário particular de Collor, Cláudio Vieira, teve de pegar dinheiro emprestado de agiotas em Brasília. Não honrou as dívidas e passou a ser ameaçado de morte, segundo contou a amigos. Por fim, Cláudio Vieira decidiu sair da capital federal. Foi visto pela última vez em Recife.
Lafaiete Coutinho, ex-presidente do Banco do Brasil, está sendo processado por crime contra a honra. Ele é apontado pelo Ministério Público Federal como um dos divulgadores do chamado dossiê Caribe --conjunto de papéis sem autenticidade comprovada sobre uma suposta conta secreta de FHC, do ministro José Serra (Saúde), do governador Mário Covas (São Paulo) e de Sérgio Motta, ministro das Comunicações que morreu em 98.
Entre os ex-ministros do governo Collor, dois foram condenados a penas de prisão por corrupção passiva durante o exercício do cargo: Zélia Cardoso de Mello (Fazenda) e Antônio Rogério Magri (Trabalho e Previdência Social). Ambos estão recorrendo das sentenças.
Idealizadora, em 1990, do confisco de dinheiro de correntistas, poupadores e investidores, Zélia foi condenada a 13 anos e quatro meses de prisão pela Justiça.
A acusação contra a ex-ministra é ter recebido dinheiro de uma associação de empresas de ônibus interestaduais após conceder reajuste de 17,4% nos preços das tarifas do setor. O dinheiro teria sido utilizado por Zélia na reforma de sua casa.
Magri foi condenado a dois anos de prisão. Em 1992, numa conversa telefônica grampeada, o então ministro do Trabalho e da Previdência Social concordou em receber US$ 30 mil para liberar dinheiro do FGTS para uma obra de saneamento no Acre.

Com FHC
Outros ex-ministros de Collor tiveram destino melhor. Acabaram voltando ao governo, pelas mãos do presidente Fernando Henrique Cardoso.
O cardiologista Adib Jatene voltou ao comando do Ministério da Saúde, o mesmo que havia ocupado durante o governo Collor. Porém, acabou pedindo demissão, após enfrentar problemas políticos. Hoje, dedica-se à medicina.
Outro que retornou ao mesmo posto foi Reinhold Stephanes, ex-ministro da Previdência de Collor e FHC.
Ex-ministro de Minas e Energia de Collor, Pratini de Moraes é hoje ministro da Agricultura.
Celso Lafer, que ocupou o cargo de ministro das Relações Exteriores na gestão de Collor, foi, por um breve período, ministro do Desenvolvimento de FHC. Agora, Lafer está cotado para voltar ao comando do Itamaraty numa possível reforma ministerial.
FHC ainda transformou em ministros dois nomes de projeção no "staff" de Collor: Renan Calheiros e Antônio Kandir.
Em 90, Calheiros -então deputado federal pelo PRN- chegou a líder do governo na Câmara após se destacar na campanha eleitoral "collorida". A lua-de-mel acabou e veio o rompimento depois que Calheiros foi abandonado, política e financeiramente, pelo grupo de Collor na disputa pelo governo de Alagoas.
Em 98, Calheiros tornou-se ministro da Justiça de FHC por indicação do PMDB. Saiu do governo no ano seguinte e voltou a ocupar sua cadeira na Câmara.
Ex-secretário de Política Econômica e também mentor do confisco, Kandir foi ministro do Planejamento de Fernando Henrique. Após deixar o cargo, também retornou à Câmara dos Deputados.
Joaquim Roriz, que foi ministro da Agricultura de Collor durante 15 dias, em 98, elegeu-se, pela segunda vez, governador do Distrito Federal pelo PMDB.

Congresso
Em Brasília, o Congresso é a instituição que abriga mais ex-colaboradores de Collor.
No Senado, além de Calheiros, estão lá Jorge Bornhausen (ex-secretário de Governo de Collor), Romeu Tuma (ex-diretor-geral da Polícia Federal e ex-secretário da Receita Federal) e Bernardo Cabral (ex-ministro da Justiça).
Um dos mais antigos amigos de Collor, Luiz Estevão ocupava uma vaga no Senado até ser cassado, neste ano, devido ao envolvimento do seu nome no escândalo de desvio de verbas da obra do TRT paulista.
Ele foi um dos principais personagens da chamada Operação Uruguai -suposto empréstimo de US$ 5 milhões apresentado como fonte de recursos de Collor.
Luiz Estevão foi um dos fiadores do suposto empréstimo, formalmente contraído em uma instituição financeira do Uruguai. O outro fiador foi Paulo Octávio, também empresário e amigo, atualmente deputado federal pelo PFL.
Cláudio Humberto Rosa e Silva, ex-porta-voz de Collor, voltou a exercer a profissão de jornalista e assina uma coluna política publicada em vários jornais do país.

(Colaborou Silvana de Freitas, da Sucursal de Brasília)




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