São Paulo, Domingo, 30 de Maio de 1999
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SISTEMA FINANCEIRO
Documentos usados eram falsos, assim como referências aceitas por agência bancária em São Paulo
Em 20 dias, conta movimenta R$ 3,5 mi

CRISTIANE BARÃO
enviada especial a Araraquara

RICARDO GALHARDO
da Reportagem Local


Mesmo recebendo cerca de R$ 4.000 por mês, o gerente de uma concessionária da Toyota de Araraquara Antonio Carlos Rondon Júnior, 35, foi notificado pelo Banco Central para que explicasse a origem de R$ 3,5 milhões movimentados em uma conta em seu nome no BCN em 97.
A quantia, segundo o BC, foi remetida ao exterior no período de 19 de novembro a 9 de dezembro.
A remessa de dinheiro foi feita por meio de cheques de conta de uma agência do BCN de São Paulo. Ele diz que nunca foi correntista do banco. "Fiquei sem saber o que havia acontecido. Sou assalariado e nunca enviei nada para fora."
Para tentar explicar ao BC o que havia acontecido, Rondon Júnior pediu cópia da documentação da conta e dos cheques citados. Ao todo, foram 26 cheques com valores de R$ 80 mil a R$ 298 mil nominais à Real Câmbio, uma casa de troca de moeda de Foz do Iguaçu (PR).
Em um mesmo dia, chegaram a ser emitidas quatro ordens de pagamento, com a mesma assinatura. Morando em Araçatuba (532 km de SP) à época, ele foi até a agência do BCN em São Paulo para retirar um extrato da conta e saber o meio pelo qual ela havia sido aberta. A conta corrente não foi localizada, nem com a apresentação de seus documentos originais.
Com base na documentação fornecida pelo BC, ele descobriu que a conta corrente foi aberta no dia 4 de novembro de 97, e os talões de cheques, emitidos no dia 11.
O RG utilizado como documento tinha os mesmos dados do registro original, mas a foto de identificação havia sido trocada. Na fotografia, a data e a camisa eram as mesmas, mas o rosto era de uma pessoa desconhecida.
A Folha constatou que a conta de Rondon Júnior -que na foto abaixo não quis mostrar seu rosto- na agência 013 do BCN foi desativada. Ao tentar fazer um depósito em seu nome na sexta-feira, funcionários do banco informaram que a conta foi bloqueada, provavelmente por falta de movimentação.
Também foi possível constatar que o endereço das pessoas citadas como referências comerciais para abertura da conta é falso.
Uma das exigências para a abertura de conta corrente no BCN é a apresentação de pelo menos duas pessoas que atestem a idoneidade do candidato a correntista.
As referências da ficha de Rondon Junior são Rita de Cássia Moreira Ronchi e Fernando Bruno Carignani. No endereço que está na ficha funciona uma lanchonete.
Mas ninguém com esses nomes trabalhou lá. "Acho que passaram endereço falso. Essas pessoas nunca trabalharam aqui", disse Jovelina Martins, gerente da lanchonete desde a inauguração. Detalhe: a lanchonete fica exatamente em frente à agência do BCN onde a conta foi aberta.
A gerente-geral que autorizou a abertura da conta em nome de Rondon Junior, Rosa Maria de Nazare Nardi, disse que não tinha controle sobre as contas e não se lembra do caso. "Não conheço todas as pessoas físicas. O responsável por checar os dados dos correntistas é o gerente-operacional."
Ela se recusou a comentar o fato de uma pessoa física movimentar R$ 3,5 milhões em 20 dias ter passado despercebido.
A gerente-operacional à época era Heloisa Helena Alves Castro Libanone. Ela também disse que não se lembra do caso. A assessoria de imprensa do banco informou que o BCN não pode se manifestar sobre o caso, sob o risco de ferir o sigilo bancário garantido por lei.


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