São Paulo, sábado, 31 de agosto de 2002

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FOLCLORE POLÍTICO

Malogro revolucionário no Pará

JARBAS PASSARINHO

Indicado pelo marechal Castello Branco, o governador recebeu abundantes denúncias de corrupção na administração anterior. Ele as havia encaminhado à Comissão de Investigação Sumária, presidida por um jurista, que passou a ouvir os denunciados. Como o governador só tivesse assumido em junho, e o presidente Castello houvesse limitado a vigência das medidas de exceção, a comissão tinha que trabalhar velozmente para concluir seu trabalho e submetê-lo ao governador.
Independente da autoridade que lhe dava o Ato Institucional, o governador em pessoa começou a visitar o interior do Estado, dadas as informações que recebia de vasta rede de corrupção dos coletores nomeados segundo indicações políticas, que não autuavam sonegadores do Partido Democrático Social, que fora apeado do poder. Inesperadamente voou para a ilha do Marajó, pousou na cidade de Muaná. Ouvindo testemunhas teve a confirmação de que o coletor fraudava notas fiscais favorecendo um comerciante que chefiava o Partido Social Democrático local (PSD) , que o havia indicado ao governador deposto. Demitiu-o. Em seguida, visitou o chefe pessedista na sua olaria beneficiada pelo coletor. Era conhecido pelo apelido de "Mãozinha", porque perdera a mão direita em acidente.
Bem-humorado, perguntou-lhe se era o chefe do PSI. A resposta, altiva, foi que seu partido era o PSD, ao que o governador retrucou: "Não. Seu partido é o PSI".
"Que é isso, governador?", perguntou intrigado o comerciante. E insistiu: "Sou chefe do PSD".
"Não", respondeu o governa dor. "O seu é o PSI, o Partido da Sonegação do Imposto", disse, provocando risos.
O comerciante, que já fora prefeito do município e que já fora rapidamente informado sobre as pessoas que o haviam delatado, perdera o medo do governador revolucionário. Só tivera oportunidade de ver suas fotografias na imprensa da capital. Indignado com os delatores, abriu um riso nervoso, defendeu-se dizendo que os delatores sim que eram ladrões quando a UDN mandava no município e que não tinham autoridade moral para acusá-lo. E saiu-se com esta quadra:
"O meu defeito físico,
É um benefício pra Nação,
Os outros roubam com as duas,
E eu roubo com uma só mão"


JARBAS PASSARINHO, 82, governador do Pará (1964 a 1966), ministro do Trabalho no governo de Costa e Silva e da Justiça no governo de Fernando Collor, escreve aos sábados nesta seção



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