|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Da boca para fora
O "programa" lançado por Lula retoma com mais agressividade seu escapismo no assunto corrupção
O NÍVEL de sinceridade na disputa pela Presidência teve
uma pequena melhora, com
os ataques desferidos por Lula, Alckmin e Fernando Henrique, como expressão, afinal, de sentimentos pessoais evidentemente reprimidos.
Mas os respectivos argumentos em
nada atenuaram a mediocridade,
que já parece sem remédio, da atual
campanha. O acerto da pontaria é
feito com desrespeito acintoso aos
fatos e ao eleitor.
O "programa" lançado por Lula,
sem programa algum e apenas para
cumprir uma formalidade, retoma
com mais agressividade o seu escapismo no assunto corrupção: "como
podem falar de ética os autores da
privataria/que engavetaram denúncias na Justiça/[abafaram] dezenas
CPIs"? Por maior que possa ser a
procedência desse questionamento,
não leva os erros graves de ontem a
anular os graves erros de hoje. Nem
os desculpam. Os erros do PT e de
integrantes da cúpula do governo,
inclusive do círculo do Planalto,
continuam sem receber de Lula
uma palavra decente ao eleitorado,
sem inverdades e artimanhas.
Caso este último, mais uma vez, da
declaração que Lula acrescentou ao
lançamento do "programa": "No
meu governo é assim, não tem sujeira embaixo do tapete, doa a quem
doer. Denunciem tudo o que for, que
nós vamos apurar." As atitudes do
PT no Congresso são todas orientadas pela Presidência. Com maior freqüência, sem reserva alguma. E o
PT lutou de todos os modos para
evitar as CPIs dos Correios, dos Bingos e do Mensalão. Nelas, lutou ferozmente para impedir e, quando
impossível fazê-lo, para dificultar a
apuração dos fatos e de suas autorias. As CPIs só se instalaram porque a Presidência da República, o PT
e a chamada base do governo foram
derrotados. Logo se viu que havia
motivos fortes para tal resistência, e
melhor faria Lula se a eles se referisse quando diz que "no meu governo
é assim".
Na exaltada reação às referências
do "programa" de Lula ao seu governo, Fernando Henrique fez a observação correta de que "não adianta
dizer que o sistema é culpado. O sistema tem muitos erros, mas moral é
conduta, é pessoal, é individual.
Quem falha tem que ser punido porque falhou." Poderia desenvolver a
observação, com muita utilidade.
Preferiu outra via: "Quando há desvio ou alguma coisa equivocada, ele
[Lula, claro] passa a mão na cabeça e
diz que o companheiro errou. Não.
O senhor errou, porque não puniu o
companheiro. Isso precisa ser dito e
cobrado".
Como precisa ser dito e cobrado,
também, que isso mesmo foi feito no
governo Fernando Henrique. Flagrado e gravado ao fazer tráfico de
influência em benefício de empresa
estrangeira, dentro mesmo do Planalto, o embaixador Júlio Cesar
Santos recebeu na cabeça a mão
protetora do presidente e, ainda
mais, o presente de uma embaixada
em Roma. Os que avançaram no "limite da responsabilidade", para manipular privatizações, e tantos outros, saíram incólumes do risco de
CPIs, por ação direta da Presidência.
A sinceridade melhorou um pouco, mas em mão única.
Texto Anterior: Presidente não acompanha o enterro, mas discursa no velório de dom Luciano Próximo Texto: Eleições 2006/Presidência: Orçamento 2007 não reduz carga tributária Índice
|