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Desenvolvimentismo vira mais retórica e menos conteúdo
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Anunciado por seus adeptos
no governo como diretriz para
o segundo mandato de Luiz
Inácio Lula da Silva, o desenvolvimentismo se mantém como um discurso com apelo no
meio político, mas seu conteúdo se dilui a cada eleição.
Em 1998, as promessas tucanas de nova orientação para o
segundo mandato ficaram na
criação do Ministério do Desenvolvimento. Em 2002, a
campanha petista ainda falava
em substituição de importações e política industrial, dois
dos pilares do pensamento e da
prática desenvolvimentista que
predominou no país entre as
décadas de 30 e 80 do século
passado. Hoje, a palavra não
significa muito mais do que o
desejo declarado de acelerar o
crescimento econômico.
Nem os assim chamados desenvolvimentistas, encontrados sob diversas formas tanto
no PT como no PSDB, têm mais
a expectativa de retornar aos
tempos em que o país mantinha sua economia fechada ao
resto do mundo, a cotação do
dólar era tabelada, estatais
eram criadas para suprir a carência de investimentos privados e ninguém se importava se
o déficit público era coberto
por emissão de moeda.
A partir dos anos 50, quando
ganhou status de quase ideologia, até 1980, quando iniciou
sua crise terminal, esse modelo
baseado nas idéias da Cepal
(Comissão Econômica para a
América Latina, agência da
ONU) levou o país a crescer a
uma média de 7,4% ao ano e a
deixar de ser uma economia essencialmente agrícola.
Sua substituta, a agenda liberal recomendada internacionalmente para os países latino-americanos, não conseguiu
mais do que uma taxa média
anual de crescimento de 2,1%
entre 1990 e o ano passado -o
que ajuda a explicar a sobrevivência, ao menos na retórica,
do desenvolvimentismo.
Só reação
Embora tenham se mantido
influentes no debate político,
os desenvolvimentistas não
conseguiram, no período, mais
do que ajudar a conter a velocidade do avanço da ortodoxia liberal. Acusaram de excessivos,
por exemplo, a abertura comercial e financeira e os apertos fiscal e monetário. Estiveram longe, porém, de ditar a pauta dos
governos FHC e Lula.
Nos oito anos de tucanato, a
corrente teve como principais
representantes os ministros
Luiz Carlos Bresser-Pereira
(Administração e Ciência e
Tecnologia) e José Serra (Planejamento e Saúde). Sob o petista, destacaram-se Carlos
Lessa, que deixou o BNDES
atacando a política econômica,
e Guido Mantega, que deixou o
banco de fomento para assumir
o Ministério da Fazenda.
Primeiro desenvolvimentista no posto em 20 anos, Mantega ainda batalha para se manter
em um segundo mandato. Até
aqui, guiou-se pela moderação,
limitando-se a conduzir um alívio calculado e eleitoralmente
conveniente da política fiscal.
Para o futuro, acena com uma
aceleração do corte dos juros
do Banco Central.
Sua pretensão esbarra, porém, no maior trunfo popular
do modelo liberal sob FHC e
Lula -a queda da inflação herdada, justamente, do colapso
do desenvolvimentismo e, por
extensão, a queda da desigualdade social desde 1994.
Hipóteses
Apenas três hipóteses permitem apostar numa redução
mais radical dos juros: 1) a política atual do Banco Central está
equivocada e pratica juros desnecessariamente altos; 2) o governo petista aceitará uma inflação bem maior que a meta de
4,5% ao ano; 3) o próprio BC
entende que já afastou os riscos
inflacionários.
Os dois primeiros casos significariam uma ruptura de Lula
com o pensamento que norteou seu primeiro mandato e
deu resultados decisivos para
sua reeleição. Na terceira e improvável possibilidade, trata-se
de continuidade da política anterior, não da adoção de um novo modelo.
Especulação à parte, o próprio Mantega diz que o governo
já pratica hoje o desenvolvimentismo, em oposição ao
"neoliberalismo" de Fernando
Henrique Cardoso -o que
mostra como os termos se tornaram adaptáveis às conveniências políticas.
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