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Profundezas antárticas têm novas espécies

Cientistas britânicos identificaram caranguejos, anêmonas, estrelas-do-mar e moluscos desconhecidos no oceano

Criaturas vivem perto de chaminés vulcânicas submarinas, formando comunidade de seres vivos única da região

Divulgção Universidade de Oxford
Caranguejos Kiwa, de espécie ainda não batizada, empilhados perto de chaminés vulcânicas; densidade dos bichos chega a 600 por m2
Caranguejos Kiwa, de espécie ainda não batizada, empilhados perto de chaminés vulcânicas; densidade dos bichos chega a 600 por m2

REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR DE “CIÊNCIA E SAÚDE”

A profundidade supera os 2.500 m, a água é gelada, a luz solar nunca brilha ali. Mesmo assim, a abundância de vida chega a ser obscena: 600 caranguejos graúdos por metro quadrado, às vezes empilhados em múltiplas camadas. Bem-vindo às chaminés vulcânicas da Antártida.

Cientistas liderados por Alex Rogers, da Universidade de Oxford (Reino Unido) acabam de publicar a primeira descrição desse ambiente quase extraterrestre na revista especializada "PLoS Biology". No menu de frutos do mar, estão espécies nunca antes vistas de anêmonas, estrelas-do-mar, moluscos e, claro, caranguejos.

Os dados ainda são preliminares, mas indicam que a região que os pesquisadores estudaram, localizada entre a América do Sul e o continente antártico, no mar de Scotia, é sui generis até para os padrões exóticos das chaminés submarinas.

Esse tipo de ambiente existe em águas profundas de todos os oceanos da Terra e possui um padrão típico de "moradores". No caso do mar de Scotia, no entanto, a comunidade de seres vivos parece ter composição própria, distinta da de outros locais.

Se a impressão estiver correta, ela reforça o que os biólogos já andavam mostrando sobre a vida marinha das profundezas da Antártida: apesar do frio, ela é exuberante, diversificada e rica em endemismos, ou seja, espécies que só existem ali.

CHEIROSO

Para sobreviver e prosperar num lugar tão inóspito quanto os abismos do mar de Scotia, caranguejos e companhia contam com a malcheirosa ajuda do H2S (sulfeto de hidrogênio ou gás sulfídrico), substância responsável pelo odor dos ovos podres.

É que, nas fissuras do solo oceânico, causadas pelo movimento das placas sobre as quais se apoiam os continentes, as profundezas quentes da Terra "cospem" esse e outros compostos químicos.

Bactérias especializadas, capazes de encarar as temperaturas de quase 400 graus Celsius perto das chaminés, usam o enxofre, o hidrogênio e outros elementos químicos para se sustentar.

E são essas bactérias, por sua vez, que ajudam a sustentar os animais que colonizam essas regiões com atividade vulcânica. Inicialmente, acreditava-se que eles conseguiam isso simplesmente devorando os tapetes microbianos que as bactérias formam no solo marinho. Mas a coisa é bem mais complicada.

Na verdade, é comum que os micróbios sejam não comida, mas simbiontes dos animais: ficam abrigados no organismo dos bichos, ou em cima do corpo deles, produzindo alimento para eles e ganhando, em troca, proteção contra predadores.

É o que parece acontecer com os caranguejos do gênero Kiwa (ainda sem nome de espécie) flagrados pelos cientistas com seus submarinos-robôs: quanto mais perto das chaminés vulcânicas, mais eles possuem bactérias abrigadas em seu corpo, e maiores os caranguejos ficam.

Em outros ambientes com chaminés submarinas, são comuns invertebrados ausentes do mar de Scotia, como poliquetas (bonitos vermes aparentados às minhocas) e certos camarões.

Por isso, a equipe de Oxford especula que a comunidade de organismos ali tem uma trajetória evolutiva própria, separada da de outras regiões dos oceanos.

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