São Paulo, sábado, 02 de junho de 2007

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Lula critica plano de Bush para conter o aquecimento global

Para presidente, proposta apresentada anteontem pelo líder americano é "voluntarista" e não estimula cumprimento

Brasileiro diz que idéia dos EUA não prevalecerá sobre pacto multilateral, mas se cala sobre plano alemão de limitar aquecimento a 2C

Wolfgang Kumm/ Efe
Manifestantes críticos ao G8 desfilam em Berlim com bonecos gigantes representando Bush, um urso polar e um globo terrestre pegando fogo devido às emissões de gases de efeito estufa

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva rejeitou ontem a proposta de seu colega norte-americano George Walker Bush a respeito do combate ao aquecimento global, classificando-a de "voluntarista".
Acrescentou que "não existe perspectiva de a proposta de Bush prevalecer sobre o Protocolo de Kyoto ou outras propostas multilaterais".
Para Lula, as idéias do presidente norte-americano deixam a critério de quem quiser combater o aquecimento global que o faça, liberando "quem não quer para não fazê-lo". Fechou o raciocínio assim: "Se nós já temos uma proposta do Protocolo de Kyoto, por que inventar outra e não cumprir aquilo que já está determinado? Se um país não é capaz de cumprir o resultado de uma convenção internacional, não vai ser de forma voluntária que esse país vai cumprir".
A proposta de Bush foi feita na noite de anteontem e representou o que a imprensa internacional considerou a maior guinada até agora em seu discurso sobre o clima. O presidente dos EUA convocou os 15 países que mais emitem gases de efeito estufa a se reunirem, no último trimestre do ano, para tentar definir metas comuns de redução de emissões.
A guinada não convenceu. Como escreveu o editor de Ciência da Folha, Claudio Angelo, "o discurso é propositalmente vago, contraditório e inclui um oximoro ("carvão limpo') entre as soluções do problema ambiental".
Lula, sem ser tão contundente, adotou o mesmo tom cético, ao dizer que quer ouvir a proposta do próprio Bush, "ao vivo", durante a cúpula do G8, a ser realizada na próxima semana em Heiligendamm (Alemanha). Lula participa no último dia, quando o encontro toma a forma de G8+5 (os oito grandes mais cinco países em desenvolvimento convidados).
Lula vai vender a tese pela qual admite ter "fanatismo", qual seja, a de que os biocombustíveis podem ser "uma alternativa para a humanidade".
Em entrevista dada na residência da embaixada do Brasil em Londres, Lula disse que "o Brasil mostrou ao mundo, desde 1975, que é possível ter outro caminho". Acrescentou: "Estamos há quase um século comprando petróleo dos países árabes. Acho que agora podemos comprar combustível dos países africanos, da América Latina, que são países que têm disponibilidade de terra, que têm água, sol".
É uma alusão ao sonho antigo do presidente de que os países ricos financiem a expansão das plantações para produzir álcool a partir da cana-de-açúcar em regiões como a América Central e a África. Segundo Lula, trata-se, ao contrário do discurso de Bush, de "uma proposta concreta para mudar a matriz energética do mundo".
O presidente reconhece que, há dez anos, "esse tipo de conversa seria tido como coisa de lunático. Mas, hoje, temos muito mais autoridade tecnológica e autoridade política para convencer o mundo".
Lula sonha em voz alta: "Imagine se cada país adotar 10% de etanol, o benefício que vai causar ao meio ambiente e ao mesmo tempo o que vai levar de desenvolvimento aos países com potencial agrícola".

"Debate novo"
Ele não quis, no entanto, dizer se o Brasil concorda com a proposta da chanceler alemã Angela Merkel, no sentido de limitar o aquecimento da Terra no fim do século em 2C, para o que seria preciso reduzir à metade até 2050, em relação aos níveis de 1990, a emissão de gases de efeito estufa. "Trata-se de um debate novo, que carece de um processo de convencimento dos países", escapou.
Os Estados Unidos sempre se opuseram à adoção de metas numéricas para a emissão de gases, ponto em que acabam tendo o respaldo de China e Índia, que não querem ver prejudicado o seu desenvolvimento.
Mas Lula lembrou que "hoje, um país pode crescer sem poluir tanto como há 50 anos". Depois, acrescentou o óbvio: "A China e a Índia, como o Brasil, obviamente não podem parar de se desenvolver. Mas poderemos crescer de forma mais razoável. Até agora, não se levou em conta a necessidade de preservar o planeta".
O presidente até concordou com a hipótese de que Brasil, China e Índia venham futuramente a formar um bloco em negociações ambientais. "Precisamos avançar nessa direção", disse, depois que lembrar que, hoje, os três formam um grupo (G20) apenas para as negociações comerciais da Rodada Doha.


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