São Paulo, sábado, 04 de dezembro de 2004

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Casal vive como índios pré-históricos

Jefferson Coppola/Folha Imagem
Djanira Pereira, 55, se refugia do sol em abrigo rochoso no PI, onde há um sítio arqueológico


DA ENVIADA A SÃO RAIMUNDO NONATO (PI)

Os pés descalços e empoeirados denunciam o modo de vida de Djanira Amorim Pereira, 55. Ela e seu marido, Francisco, 55, vivem há meses de uma maneira bastante parecida com a dos primeiros moradores do Boqueirão das Camas, no Piauí, há 3.000 anos.
O casal, junto há 37 anos, se abriga do sol e da chuva da caatinga sob paredões rochosos inclinados pela erosão. Ripas arranjam um quarto e palafitas mantêm a comida longe do chão.
Nas paredes, em vez de quadros, havia desenhos milenares deixados pelos antigos condôminos. Agora, estão cobertos por uma camada grossa de fuligem, porém um ou outro risco ainda pode ser visto -com atenção.
Djanira e Francisco são moradores do município de São Raimundo Nonato, mas vivem no sertão para plantar mandioca, feijão e milho para consumo próprio -e caçar de forma ilegal, diz o Ibama. É uma atividade mais lucrativa do que o serviço de vigia noturno que ele mantém em uma clínica na cidade.
A caça de animais, especialmente tatus, é estimulada por um mercado negro local, que vê o bicho como iguaria. Quanto mais raro e ameaçado é o animal, mais alto é o preço pago por ele. Técnicos do Ibama que acompanharam a reportagem dizem que os animais abatidos são guardados em locais afastados, o que dificulta a apreensão e o flagrante.
O casal não admite a caça, tampouco a destruição do sítio arqueológico. No interior da casa improvisada, fumaça sai de uma lata e cobre a parede rochosa. Djanira é rápida em dizer que não havia desenhos naquele ponto, mesmo sem ser questionada da existência da pintura. "A fumaça é para espantar mosquito", afirma.
Apesar das condições precárias, eles não pensam em sair do boqueirão. "Essa terra é nossa, tenho até um papel para provar", diz Francisco, enquanto afia o facão.
Segundo ele, técnicos do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) estiveram na região. O órgão atualmente analisa a possibilidade de assentar famílias no sudeste do Estado. "No começo, achava bom [as visitas]. Mas agora estou me sentindo meio incomodado. Eles não trazem nada para a gente." (CAm)


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