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Demora em avaliação ética atrasa pesquisas no Brasil
Lentidão impede acesso de médicos e pacientes a medicamentos experimentais
Regras que exigem repetir procedimentos burocráticos deixam o país fora de testes clínicos que podem ajudar a ciência e a saúde pública
DENISE MENCHEN
DA SUCURSAL DO RIO
Apesar de ter sido criada para
ajudar no cumprimento de direitos básicos dos cidadãos brasileiros, a Conep (Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa)
é apontada hoje como um dos
entraves às pesquisas envolvendo novos medicamentos e
procedimentos de saúde que
podem vir a ajudá-los.
O aval do órgão é indispensável para o ingresso do Brasil em
estudos com cooperação estrangeira ou que abranjam
áreas como genética humana e
biossegurança. Mas ele sofre
falta de funcionários concursados, inexistência de um sistema
on-line para o registro de projetos e inadequação da estrutura
ao volume de trabalho.
As falhas são reconhecidas
pela coordenadora da comissão, Gysélle Tanous, que defende mudanças para dar agilidade
ao órgão. Segundo ela, o processo de aprovação dos projetos
dura, em média, quatro meses,
em razão de uma série de procedimentos (veja quadro acima). Até o envio de documentos prolonga a tramitação, pois
o material não pode ser encaminhado por e-mail.
A demora começa já dentro
dos Ceps (comitês de ética em
pesquisa) das próprias instituições, que têm de avaliar os trabalhos antes da Conep. Depois
de análise preliminar, um conselheiro deve elaborar um parecer sobre os aspectos éticos
da pesquisa apreciada.
A avaliação é então submetida ao crivo dos demais conselheiros -voluntários das áreas
médica, jurídica e religiosa, entre outros. As reuniões para votação são mensais. Se houver
pendências no projeto, o mesmo é reenviado ao pesquisador
para alterações, num processo
que pode levar meses.
Cautela redundante
"A regulação é absolutamente indispensável, mas o processo é um exagero de redundância", diz Eduardo Côrtes, coordenador de pesquisa em câncer
do Hospital Clementino Fraga
Filho, no Rio, que hoje tem nove estudos em trâmite.
Segundo ele, é comum a indústria farmacêutica acionar
centros de diversos países para
atingir de forma mais rápida o
número alvo de pacientes em
testes clínicos. Se o processo
for muito demorado aqui, pesquisadores e pacientes brasileiros ficam de fora dos trabalhos.
Mesmo quando há tempo, o
país às vezes participa com apenas 1% ou 2% dos pacientes.
Segundo Volnei Garrafa, especialista em bioética da Universidade de Brasília, a estrutura da Conep não acompanhou a
ciência nacional. "O Brasil hoje
produz mais trabalhos científicos do que toda a América Latina. A Conep está afogada em
meio a esse crescimento." Segundo ele, porém, é preciso agilizar a avaliação de pesquisa
sem afrouxar os padrões éticos.
A Conep diz que cerca de
30% dos projetos encaminhados têm de ser revistos porque
incluem procedimentos que
não são mais aceitáveis. "Seria
bem mais fácil se a indústria
entendesse isso", diz Tanous.
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