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Teimosia de alemão levou a descoberta
DA REDAÇÃO
A história da descoberta da
ligação entre o papilomavírus humano e o câncer de colo de útero é uma história de
sucesso na medicina como
poucas. Mas ela só aconteceu
por conta da teimosia do alemão Harald zur Hausen.
Nos anos 1970, ele ousou
desafiar seus pares ao propor
que o HPV, causador de verrugas, era o agente do tumor
cervical. Até então, achava-se que o causador desse tipo
de câncer fosse sexualmente
transmitido, mas a suspeita
recaía sobre o vírus do herpes. Mas Zur Hausen achava
o DNA desse vírus nas amostras de câncer que estudava
em seu laboratório.
A aposta do cientista no
HPV como agente causal parecia maluquice. Primeiro,
porque os tumores não produziam partículas de vírus,
como as células normais fazem. Depois, o HPV não modifica as células como o vírus
do herpes faz. "Parecia que
não havia nada ali. Parecia
que ele estava procurando
um fantasma", disse à Folha
a médica Luísa Villa, do Instituto Ludwig de São Paulo,
especialista em epidemiologia de HPV. Ela e seus colegas esperam "há tempos" o
Nobel para essa área.
Nos primeiros cinco anos,
de fato, Zur Hausen não
achou nenhuma amostra de
tumor positiva para HPV.
Com paciência e insistência germânicas, o pesquisador resolveu pescar. Zur
Hausen raciocinou que os
genes do HPV se integravam
ao DNA da célula cancerosa,
portanto era preciso criar
uma ferramenta para tirá-los dali de dentro.
Usando as técnicas recém-criadas de DNA recombinante, ele purificou "sondas"
de DNA de HPV extraídas de
verrugas de pé e testou-as
em amostras de DNA extraído de células tumorais. Se as
fitas de DNA grudassem uma
na outra, era sinal de que havia genes de HPV no câncer.
A pescaria genética funcionou, mas Zur Hausen
descobriu que não havia um
só tipo de HPV, e sim diversas variedades desse vírus.
O primeiro que ele isolou
em associação com tumor
cervical foi o HPV-16, em
1983. "O segundo foi o HPV-18, isolado de uma amostra
[biópsia] que veio de uma
brasileira de Recife", diz Villa. Juntos, esses dois tipos
de vírus causam 70% dos tumores de colo de útero.
A descoberta desencadeou
uma série de estudos epidemiológicos mundo afora, que
acabaram por confirmar o
elo causal. "Com as vacinas
profiláticas veio a demonstração definitiva", diz Villa.
"Agora, esperamos viver para ver a incidência do HPV ir
diminuindo na população,
nos próximos anos."
(CA)
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