São Paulo, Domingo, 09 de Maio de 1999
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FUTURO
Bicho-da-seda recebe novo gene e se torna fluorescente; experimento pode melhorar produção do tecido no Japão
"Brilho-da-seda'

MARCELO FERRONI
da Reportagem Local

A genética chegou à produção de seda no Japão. Cientistas inseriram um gene que cria um composto fluorescente no bicho-da-seda, em um estudo que pode abrir caminho para o desenvolvimento de novas texturas do tecido.
O inseto "turbinado" não produziu ainda seda fluorescente, mas, segundo Hajime Mori, pesquisador que participou do estudo, o experimento pode levar, por exemplo, ao desenvolvimento de sedas mais resistentes a partir da inserção de novos genes.
"Poderíamos inserir no bicho-da-seda genes que produzem a teia de aranha para criar tecidos resistentes, que poderiam ser usados em coletes à prova de bala ou no tecido de pára-quedas", afirmou Mori, em entrevista por e-mail à Folha.
A modificação do bicho-da-seda (de nome científico Bombix mori) foi divulgada na revista "Genes & Development" de 1º de março deste ano por pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Kyoto, do Instituto Nacional de Ciência de Sericultura e Entomologia e da Fundação Kinugasakai.
No estudo, os cientistas inseriram em fêmeas do bicho-da-seda o gene GFP, que, quando ativado, produz uma proteína fluorescente. Sua fluorescência pode ser observada com a ajuda de uma luz ultravioleta.
Em seguida, a fêmea cruzou com insetos normais e gerou novos bichos-da-seda, que, segundo os pesquisadores, apresentaram o gene GFP em sua composição.
Quando expostos aos raios ultravioleta, esses bichos-da-seda apresentaram traços de fluorescência pelo corpo.
A proteína gerada pelo gene foi detectada também nas glândulas que produzem a seda, que ficaram fluorescentes com a luz ultravioleta, e nos fios de seus casulos.
Mas os casulos não ficaram brilhando na presença da luz especial, apesar de conterem a proteína produzida pelo GFP. A sua presença foi descoberta porque houve uma reação quando os pesquisadores colocaram a fibra em contato com um anticorpo.
"O GFP é inadequado para a produção de seda colorida ou fluorescente. Mas outras proteínas, como a luciferase e algumas encontradas em micróbios, poderiam ser úteis para a produção do tecido em cores", disse Mori.
Além do uso prático do estudo -produzir novos tipos de fibras-, os pesquisadores indicaram também, em seu estudo na "Genes & Development", que "as manipulações genéticas serão importantes para esclarecer o funcionamento da expressão de genes e para introduzir novas formas de cultivar insetos benéficos".
Segundo Mori, "poderemos produzir novas proteínas, vacinas e enzimas com os insetos modificados". Se novos estudos aperfeiçoarem a técnica, disse o cientista, será possível o desenvolvimento de um novo sistema de sericultura (produção de bichos-da-seda).

Terapia genética
O gene foi inserido no bicho-da-seda por meio de terapia genética, ou seja, os pesquisadores usaram um vírus enfraquecido como "meio de transporte" para levar o GFP ao material genético do inseto fêmea.
O vírus é enfraquecido e recebe nova carga genética. Em seguida, é inserido no inseto e "ataca" as células do bicho-da-seda, passando o material genético que interessa ao pesquisadores.
O gene GFP é usado em pesquisas de terapia genética como um indicador que determina se a experiência deu certo ou não.
Como exemplo, pesquisadores do Instituto Salk para Estudos Biológicos e do Instituto de Pesquisa Scripps, em La Jolla, na Califórnia, usaram o gene GFP para testar um método de levar novos genes a células sanguíneas usando, para isso, o vírus enfraquecido da Aids.
O GFP era passado do HIV para as células sanguíneas de ratos. Com a luz ultravioleta, os pesquisadores viam que as células "brilhavam" e, portanto, continham a substância fluorescente produzida pelo novo gene.
Os resultados foram publicados em 29 de janeiro na revista norte-americana "Science".


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