São Paulo, domingo, 12 de março de 2000


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Dados pouco convincentes criam polêmica

Isabel Gerhardt
da Reportagem Local

À primeira vista, gerar polêmica parece ser a razão pela qual os autores escreveram o livro "A Natural History of Rape". Soa revoltante o argumento de que o estupro pode ser um mecanismo evolutivo desenvolvido para aumentar o sucesso reprodutivo de homens que, de outra forma, não teriam acesso a mulheres. Mas soar revoltante pode ser uma afirmação tão vaga quanto a de Randy Thornhill e Craig Palmer. É preciso que se argumente com dados precisos.
O antropólogo Luiz Eduardo Abreu, da Universidade de Brasília, considerou o trabalho dos autores "pseudociência". "Com uma linguagem aparentemente científica, baseada em estatísticas e num enorme banco de dados, o resultado final é menos que ciência", afirmou.
"Thornhill usa como exemplo o comportamento das moscas-escorpião: a fêmea escolhe o macho que lhe traz um presente nupcial. Se o macho não tem o presente, a fêmea foge dele, e ele não tem outra alternativa senão tomá-la à força, o que significa que ele a estupra. Supondo que as observações sobre o comportamento das moscas-escorpião estejam corretas, isso não lhe permite fazer nenhuma das afirmações realizadas", disse.
Ele oferece ainda outras hipóteses que justificariam o comportamento das moscas-escorpião: a) É um ritual de acasalamento; b) A fêmea quer escolher o parceiro que tem maior probabilidade de possuir uma herança genética saudável (a demonstração disso é a capacidade de o macho conseguir comida ou copular com ela mesmo contra a sua reação violenta); c) Há duas maneiras pelas quais as fêmeas sentem prazer: uma é comendo antes da cópula, a outra é quando ela é caçada pelo macho.
Segundo Abreu, de todas as hipóteses possíveis, os autores escolheram a de que o macho estupra a fêmea. "Como dizia Popper (Karl Popper, filósofo austríaco), é fácil encontrar confirmações para qualquer teoria, desde que a procuremos. Os argumentos dos autores, em vez de nos fornecer uma demonstração científica, respondem a uma outra necessidade, de ordem ideológica: encontrar uma causa biológica para o comportamento humano, como se tudo pudesse ser reduzido à genética e por ela explicado", concluiu.


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