São Paulo, domingo, 12 de abril de 2009

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Revolução aeróbica

Fim de era de vulcanismo foi o que matou os micróbios que que impediam o sucesso da vida movida a oxigênio, indica análise de rocha

STEVE CONNOR
DO "INDEPENDENT"

Ele foi uma das mudanças mais importantes ocorridas na atmosfera terrestre e foi a razão pela qual hoje nós podemos respirar o oxigênio vitalizante. Ainda assim, o evento conhecido como a "grande oxidação" permaneceu um mistério até agora.
Sem oxigênio, a vida na Terra não existiria da forma como a conhecemos. Ele é componente do ar supercarregado que alimentou a explosão de diversidade e tamanho de todos os organismo vivos, do menor camarão ao maior dinossauro. Cerca de 21% do ar é oxigênio, ingrediente vital para organismos vivos adotarem o método mais eficiente de converter comida em energia, usando a respiração aeróbica. A atmosfera rica em oxigênio, porém, não esteve sempre aqui, e a explicação sobre como ela surgiu escapou de várias gerações de cientistas. Uma equipe de pesquisadores liderados por Kurt Konhauser, da Universidade de Alberta em Edmonton (Canadá), porém, acaba de apresentar uma explicação convincente sobre por que o oxigênio começou a se acumular de repente na atmosfera primordial da Terra, há cerca de 2,7 bilhões de anos, quando a vida consistia em nada mais complexo do que micróbios unicelulares.
A grande oxidação aconteceu, eles acreditam, quando um grupo de micróbios destruidores de oxigênio começou a se extinguir, permitindo um grupo de micróbios produtores de oxigênio entrar em ascensão. O gatilho desse evento foi uma queda nos níveis do metal níquel nos organismos, que levou a um inexorável aumento do oxigênio e da vida na Terra.
O papel do níquel na história do oxigênio atmosférico é novo. Se Kohnauser e seus colegas estiverem certos, isso poderia explicar não apenas a evolução súbita da vida, mas a própria feição da Terra, porque o poder corrosivo do oxigênio foi crucial para moldar rochas, formar rios e recortar litorais.
"A grande oxidação foi o que mudou os ambientes de superfície de modo irreversível na Terra e, por fim, tornou possível a vida avançada" diz Dominic Papineau, da Instituição Carnegie, de Washington. "Foi a maior virada já ocorrida na evolução da vida em nosso planeta, e estamos chegando perto de entender como ela ocorreu."

Super-reatividade
O oxigênio em forma de molécula é tão reativo que logo desaparece, a menos que seja produzido constantemente. A concentração de oxigênio na atmosfera hoje é mantida pelas plantas que realizam fotossíntese -a conversão de luz solar em energia química e oxigênio.
Acredita-se que os primeiros micróbios fotossintetizantes, as "algas azuis" ou cianobactérias, evoluíram 300 milhões de anos antes do evento da grande oxidação há 2,5 bilhões de anos. Mas o oxigênio que elas produziam era rapidamente destruído pelo gás metano exalado por bactérias metanogênicas, que estavam em número muito maior. Elas podiam respirar sem oxigênio usando um método menos eficiente de respiração, o anaeróbico. Essas bactérias metanogênicas -que ainda vivem em ambientes inundados e pobres em oxigênio, como pântanos- precisam de níquel para sobreviver. Sem um suprimento rico do metal, enzimas vitais desses micróbios produtores de metano são sabotadas.
Ao analisar um tipo de rocha sedimentar, as formações com bandas de ferro, cientistas descobriram que poderiam descobrir o nível de níquel nos oceanos da Terra em épocas tão antigas quanto 3,8 bilhões de anos atrás. E havia uma marcante redução no níquel entre 2,7 bilhões e 2,5 bilhões de anos atrás -o mesmo período da grande oxidação.
"A data se encaixa bem. O declínio do níquel pode ter preparado o cenário para a grande oxidação", diz Papineau. "Pelo que sabemos sobre metanogênicos vivos, níveis menores de níquel podem cortar a produção de metano. A conexão com o níquel é algo que ninguém havia levado em consideração antes, mas nosso estudo indica que ela pode ter tido um grande impacto no ambiente da Terra e na história da vida."
Konhauser diz que seu estudo, publicado na revista "Nature", sustenta a ideia de que os micróbios produtores de metano impediram o oxigênio de se acumular na atmosfera primitiva por centenas de milhões de anos. Cientistas acreditam que o nível de níquel caiu porque a crosta da Terra resfriou durante esse período, o que significa que havia menos níquel sendo ejetado por erupções vulcânicas para dentro do oceano. "Analisando rochas em formações com bandas de ferro, estamos certos de que há cerca de 2,5 bilhões de anos o níquel se reduziu para cerca de metade do nível anterior. A questão é como os micróbios metanogênicos reagiram a essa queda. Acreditamos que eles tenham morrido", diz Konhauser. Apesar de a grande oxidação não ter levado a um aumento súbito do oxigênio aos níveis que encontramos hoje, ela causou um aumento significativo, que nunca mais se reverteu.


Tradução de RAFAEL GARCIA


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