São Paulo, domingo, 26 de março de 2006

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ARTIGO

É importante para o Brasil lançar astronautas ao espaço?

LUIZ GYLVAN MEIRA FILHO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Na minha opinião, sim.
O Brasil não pode e não deve ficar à margem de qualquer desenvolvimento científico ou tecnológico que ocorra no mundo. Precisa ter um envolvimento, ainda que pequeno, em todas as aventuras do mundo moderno, para decidir quais devem ser desenvolvidas com maior profundidade.
O setor espacial está repleto de exemplos nesse sentido, e que resultaram na escolha de desenvolvimento de satélites e foguetes importantes para o Brasil. Outro exemplo é o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Inpe, que tanto contribui para nossa agricultura e outros setores.
A pergunta que se costuma fazer sobre a prioridade relativa entre programas básicos nos setores de educação e saúde versus o investimento em programas na fronteira da tecnologia como o programa espacial, incluídos aí os vôos tripulados como o do tenente-coronel Marcos Cesar Pontes, tem uma resposta simples: as duas coisas são importantes. Os investimentos em alta tecnologia são essenciais para garantir o bem-estar das futuras gerações.
Se o Brasil de Getúlio Vargas não tivesse investido na instalação da Companhia Siderúrgica Nacional, estaríamos hoje condenados a ser uma sociedade puramente agrária, com todas as dificuldades disso decorrentes.
O que fascina no caso de vôos tripulados são, por um lado, os experimentos de microgravidade que, potencialmente, podem ajudar a medicina, como no caso do crescimento de cristais de proteína realizado em 1997 por Glaucius Oliva em um ônibus espacial.
Além disso, e talvez mais importantes, são as perspectivas de novos conhecimentos ainda não imaginados, por imprevisíveis, mas que a experiência recente mostra que costumam ocorrer.
Ouço por vezes o argumento de que os recursos destinados ao programa de vôos tripulados deveriam ser aplicados em outros setores do Programa Nacional de Atividades Espaciais. Essas críticas são compreensíveis, quando provêm de técnicos brasileiros que sabem do potencial de desenvolvimento tecnológico de nosso país e gostariam de contribuir mais e mais rápido. Ocorre que, em geral, os investimentos no setor espacial estão aquém do seu potencial de realizações.
Seria razoável para o Brasil que fossem investidos cerca de 550 milhões de reais por ano no setor espacial. A experiência internacional mostra que o retorno dos investimentos no setor espacial supera com folga aquele associado a outras tecnologias, exceto a de supercomputadores.
O setor espacial brasileiro tem hoje condições de absorver investimentos dessa ordem, com retorno a curto prazo, em razão dos investimentos já realizados em instalações e capacitação de pessoal técnico. O caminho a ser seguido não é, portanto, abandonar novas fronteiras e sim garantir que o programa espacial como um todo seja desenvolvido com maiores recursos e assim realizar o seu potencial de contribuição para a construção do país do futuro.
Deixo os meus votos de sucesso para o tenente-coronel Pontes em sua nova missão e fico com a certeza de que, em seu regresso ao Brasil, muito ajudará em abrir novas fronteiras para o nosso programa espacial. Espero que sua primeira tarefa seja auxiliar na escolha de seus sucessores como astronautas brasileiros.


Luiz Gylvan Meira Fillho, físico, é professor visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP. Presidia a Agência Espacial Brasileira quando o país assinou a participação na ISS, em 1997


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