São Paulo, quinta-feira, 11 de agosto de 2011

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FOGO ALTO A visão de quem cozinha

THIAGO CASTANHO

O pirarucu e a Amazônia


Além de conhecer o fornecedor e analisar o produto, é importante que o cozinheiro pense


Jogamos com o espaço e com o tempo, tentando manter a "vitalidade" dos seres sacrificados para nos alimentar. Queremos o peixe mais fresco, a fruta recém-colhida, a erva viva no vaso. Dependemos das estações e da distância para garantir esse frescor dos alimentos.
Salga, secagem, torrefação, fermentação, confitura, moquém, defumação são exemplos de processos que adiam o apodrecimento.
Com o avanço da refrigeração e do congelamento, teoricamente não seria necessário o uso de métodos "antigos" de conservação. Aquela necessidade de conservar com o sal criou um sabor novo.
Segundo Câmara Cascudo, algumas tribos dominavam o uso de uma espécie de sal feito de cinzas, enquanto outras utilizavam o moquém, numa técnica levemente parecida com a defumação.
Com a chegada dos europeus, o sal se difundiu não só como potencializador de sabor mas como parte de uma técnica de conservação.
Na região Norte, o pirarucu é consumido na forma de mantas salgadas, quase em toda sua totalidade.
Mesmo quando o peixe é comprado fresco, o caboclo amazônida dispõe suas mantas numa salmoura por algumas horas antes de trabalhá-lo. Depois da salga, ele adquire aromas e sabores de cura, resultado da oxidação da gordura e da desnaturação de algumas proteínas. Sua textura muda, mostrando que o peixe já não é mais o mesmo.
Desde a captura, o método de processamento desses produtos ainda é muito artesanal em relação aos padrões sanitários e culinários atuais, o que resulta num produto bruto, grosseiro, sem um padrão.
Algumas vezes, são peixes que, não vitoriosos na venda, foram ao sal.
Além de conhecer o fornecedor e analisar a qualidade do produto vendido, é importante que o cozinheiro questione, pense.
Questionar uma técnica tradicional de uma cultura, respeitando-a. Isso leva a pensar na existência de outras maneiras ou processos que poderiam influenciar num produto final diferentemente melhor.

THIAGO CASTANHO, de 23 anos, é chef do restaurante Remanso do Peixe, em Belém (PA)



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