São Paulo, quinta-feira, 12 de maio de 2011

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FOGO ALTO A visão de quem cozinha

ALEX ATALA

Direto de Ibitipoca


Vou cozinhar em fogão a lenha, com alguém que tem a generosidade de ensinar. Aqui, a chef é ela


CONHECE IBITIPOCA?
Até horas atrás, eu também não!
Cheguei a esta cidadezinha, no meio das Minas Gerais, consegui conexão de internet e, com largo atraso, digito esta coluna no meu smartphone.
Sensacional!
O que seria de nós, cozinheiros, sem a tecnologia? Não estou falando só de "termomix", "ronner", "sous vide", mas de batedeiras planetárias, fornos de convexão, geladeiras... Aqui não há nada disso.
Se estou preocupado? Nem um pouco. Estou encantado, ansioso e seguro. Vou cozinhar num fogão de lenha para 50 convidados de um grande amigo, que faz 50 anos.
Esse momento me faz pensar na minha cozinha (espaço físico), nas coisas que faço e no jantar que há pouco comi, preparado por uma senhora e grande cozinheira daqui.
É aí que mora o segredo: fogão não cozinha sozinho. A maestria da mineira transforma uma simples receita num prato excepcional.
Outro grande cozinheiro, Andoni Aduriz, do Mugaritz, em San Sebastian, afirma -e eu concordo: "A técnica é uma lente de aumento. Pode transformar um cozinheiro bom em melhor, e um ruim em pior".
Por conta própria, acrescento: "O moderno não elimina o clássico, e o clássico pode ter sido contundentemente moderno em seu momento". Uma máxima vivida por Villa-Lobos, que soube levar o folclore brasileiro às lições de Bach.
Não devemos temer aprender.
Sairei daqui com outra grande lição: cozinharei com alguém que viveu para cozinhar e tem a generosidade de ensinar. Aqui, a chef é ela, e eu, um convidado do "patrão". Feliz, agradeço a ela e ao "patrão"ou melhor, meu amigo cinquentão!
Felicito este caderno por abrir este espaço, o "Fogo Alto", para que cozinheiros também possam falar.
Os chefs de hoje são profissionais multifacetados e, como atores de uma cena, peça ou roteiro, são, sim, capazes de se expressar, de estender sua personalidade, seja em uma receita, seja com palavras.
Aparecerei aqui mensalmente.
Porém, espero que seja bissextamente. Por um motivo: como na natureza, na música e na cozinha, a beleza está na diversidade. Quero ler aqui Rodrigo de Oliveira, Carla Beatriz D. Pernambuco e outros.
Em tempo: quero encorajar uma nova geração e agradecer a um de seus expoentes, Raphael Despirite, que tão bem tuitou: "Toda lista é suspeita quando não se está nela".
Valeu, garoto! Você tem futuro certo na cozinha e com as palavras.

ALEX ATALA é dono do D.O.M. e um dos dez melhores chefs do mundo, segundo o ranking da revista inglesa "Restaurant"


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