São Paulo, quinta-feira, 13 de outubro de 2011

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NINA HORTA

Festas de casamento


Essa coisa de dizer que casamento com todos em pé é moderno deu nisso, num monte de cadeiras de roda

FALO MUITO de casamentos e, geralmente, chamo a atenção para os bastidores, pois são os mais cheios de adrenalina. Tenho medo, no entanto, de dar a impressão de que cada festa é um susto, um remendar, até que tudo saia nos conformes.
Claro que não é assim, há casamentos que vão do começo ao fim sem problemas, e os preparativos não carregam consigo nenhum nervosismo, são só uma diversão para noiva, noivo, mãe, pai, sogra e sogro.
Tornam-se todos amigos, dão muita risada, a noiva aproveita a festa do começo ao fim, como se o casamento não fosse dela, mas de uma amiga querida.
Se chover na praia, não tem importância, tem o plano B, vai ficar até mais bonito. A lista de convidados transbordou, é que os noivos são tão sociáveis, e risca dali e daqui, não vai dar saia justa de jeito nenhum, os excluídos entendem.
Bom, isso seria no melhor dos mundos e acontece a cada cem cerimônias. Fico me perguntando o porquê. E acho que é o OUTRO. O OUTRO, esse inimigo ferrenho que não dá sossego a ninguém.
Um método de diminuir a ansiedade, politicamente incorreto, imagino eu, foi o que fizeram minha filha e o noivo nessa situação de festa. Concordaram que toda família tem esqueletos no armário e que os distribuiriam com equanimidade.
Assim: dois loucos para você, dois loucos para mim, duas tias caipiras para você, duas para mim, dois amigos que só saem carregados de festas para mim, não, pode ficar com um bêbado e me dá mais uma tia caipira. Crianças, não mais de seis no total, por favor! E duas babás, que vão ser madrinhas, arrumadíssimas, e que ficam a festa inteira resmungando por causa do salto alto e da novela que estão perdendo.
E um convidado performático para você, e uma diva das artes para mim. Ah, me dá três velhinhas meio ceguetas e de bengala que arranjo um garçom só para elas.
Já que você não tem avó, eu levo duas, mas onde arranjar cadeira de rodas para as duas? Nem precisam, mas reparei que tem muita gente indo a festa de cadeira de rodas. Essa coisa de dizer que casamento com todo mundo em pé é mais moderno deu nisso, um monte de cadeiras de roda falsas.
E tem também o político que ninguém sabe se vem até o último momento e que talvez chegue de helicóptero. Lembro que meu futuro genro reivindicou três convites para três tias de cabeça de repolho, nunca entendi o que eram.
O ex-namorado da noiva, videomaker famoso, ofereceu gravação e nos deixou com uma obra de arte moderníssima. Pés. Olha o pé do padre, o pé do rabino, o pé da Joana, esse não dá para disfarçar, o seu pé, mãe, duas horas de pés que iam e vinham, muito interessantes, mas que não agregaram nada ao documentário familiar.
Acho que o método exorcizou os fantasmas. Riram muito no processo, o dia estava esplendoroso, acabou numa tarde suave sobre a grama, cheia de migalhas de bolo.
Festa de casamento é isso. Se não tiver os esqueletos de sempre, qual a graça? O OUTRO não é tão negro como pintam. Somos nós mesmos, nas nossas pequenas fraquezas.
Vamos aproveitar as festas, não é todo dia que se casa.

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