São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 2011

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CRÍTICA DOCUMENTÁRIO

'O Mineiro e o Queijo' mostra como a produção artesanal está ameaçada

LUIZA FECAROTTA
DE SÃO PAULO

"Nós não temos tempo nem para morrer, né? Porque amanhã tem que fazer queijo." Não há drama no depoimento de Luciano, um produtor de queijo da Canastra, em Minas Gerais, no documentário "O Mineiro e o Queijo", de Helvécio Ratton, que estreia amanhã nos cinemas.
O queijo artesanal mineiro, declarado patrimônio cultural do Brasil em 2008 e ameaçado por uma antiga lei federal, do início dos anos 1950, conduz a narrativa.
Ratton está comprometido, aqui, com o modo de vida desses produtores rurais, que em suas pequenas propriedades chamam as vacas pelo nome para fazer a ordenha e utilizam o leite, ainda morno, no preparo dos queijos.
Ele mostra, com sensibilidade, como essa produção extensa, que toma a região do Serro, a serra da Canastra e o Alto Parnaíba, em Minas Gerais, move quase 30 mil famílias -numa tradição que passa de geração para geração desde o século 18, quando os colonizadores portugueses, em busca de ouro, transmitiram a cultura do queijo feito de leite cru nas montanhas.
É o peso das mãos que moldam os queijos, as bactérias próprias de cada região e a pastagem das vacas que conferem características únicas a esses laticínios hoje ameaçados pelo excesso de intervenção pública.
Queijos mineiros artesanais são impedidos, por uma lei federal de 52, de circular fora do Estado.
Inspirada no imperialismo higienista norte-americano, impõe período alargado -e desnecessário num país tropical como o Brasil- de maturação e de entraves na utilização de leite cru.

BARREIRAS
Ratton foi capaz de explicitar como o Ministério da Agricultura apresenta barreiras para a sobrevivência da tipicidade desses queijos, identificados com o seu território e com a sua cultura.
Aqui falta uma posição mais marcada do órgão público: por que diabos essa lei é mantida? Aos olhos do diretor, os grandes laticínios estão mobilizados: não querem concorrentes e precisam de fornecedores de leite.
Inviabilizar a produção do queijo artesanal, com imposição de exigências sanitárias que não estão adaptadas à condição real dessas queijarias, desarticula esse mercado e "força" os pequenos produtores a vender leite, que exige menos trabalho.
Na ilegalidade, mais de 90% desse produto chega a São Paulo -são vendidos nas bocas de metrôs mais populares, em feiras livres, nas vendinhas da periferia.
E, ufa, ainda é possível, mesmo que por meios tortos, provar o autêntico queijo artesanal mineiro sem ter de ir a sua origem. Por enquanto.

O MINEIRO E O QUEIJO
PRODUÇÃO Brasil, 2011
DIREÇÃO Helvécio Ratton
ONDE estreia amanhã no Espaço Unibanco Augusta, em São Paulo
CLASSIFICAÇÃO livre
AVALIAÇÃO bom




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