São Paulo, Sábado, 02 de Outubro de 1999
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LETRAS JURÍDICAS

Censura na TV e no rádio

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

Muitas vozes têm-se erguido, reclamando da baixa qualidade de certos programas de televisão exibidos no Brasil, com dano para a formação da infância e da juventude. Vozes autorizadas, de gente reconhecidamente democrata, têm mostrado preocupação justa a esse respeito. Justa e constitucional.
A Carta de 1988 veda todo tipo de censura, mas impõe princípios claros (artigo 221) para a produção e a programação das emissoras de rádio e de televisão. Define a predominância das finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, da cultura nacional e regional, com respeito pelos valores éticos e sociais da pessoa e da família brasileira.
Se o leitor cotejar os princípios referidos com a programação televisiva, mais provavelmente concluirá que essas normas não são respeitadas.
As autoridades da radiodifusão evitam editar regras restritivas por não quererem desenvolver atividade censória, que a Constituição também proíbe. A cautela é natural.
A manifestação livre do pensamento e das expressões das idéias e da arte representa a espinha dorsal da Constituição brasileira. A cidadania é a principal beneficiária da livre manifestação.
Muitos são os que favorecem a censura, sem perceberem os perigos que representa como elemento de dominação do Estado sobre o povo, geralmente com base em pressupostos falsos, como se viu durante grande parte dos governos militares.
Valores éticos e sociais da pessoa e da família são realidades variáveis, conforme o padrão de quem os defina.
Certas situações extremas são fáceis de indicar, mas a transposição dos conceitos teóricos para o dia-a-dia das emoções, de seus embates e confrontos mostra a dificuldade de distinguir o joio do trigo. A pessoa capaz de substituir cada mãe e pai na definição do que o menor deve ou não deve assistir, não é, com certeza, um ignorado funcionário da administração pública.
Há técnicas que impedirão, no futuro, o acesso a programas que os pais considerem inadequados. Serão bem-vindas quanto a crianças e adolescentes. No relativo aos adultos, a liberdade deve ser plena, irrestrita, com exclusivo juízo de escolha sobre o que cabe ou não cabe ver e ouvir.
Escrevendo recentemente nesta Folha, José Roberto Maluf, vice-presidente do SBT, tratou desse lado da questão, informando que, em dois anos, os novos televisores destinados ao público norte-americano virão com os V-chips, recurso técnico por meio do qual os responsáveis selecionarão programas e horários que as crianças poderão assistir. Espera-se que logo sejam produzidos no Brasil.
Um conselho de ética das emissoras seria, no plano da teoria, a solução ideal. Parece, porém, pouco prático, como se viu a partir de experiências anteriores. Os interesses econômicos, as preocupações com audiência preponderam na busca do lucro.
José Roberto Maluf ofereceu sugestão que, apesar das dificuldades, pode dar certo.
Para o vice-presidente do SBT, um Código de Ética da Radiodifusão seria respeitado se pormenorizasse as condutas a evitar, com penas pecuniárias para o desrespeito, de valor crescente na reincidência.
Aplicado corretamente, evitará, na medida do possível, que as queixas da sociedade contra o baixo nível e a violência (sobretudo dos enlatados) se transformem num processo crescente de pressão das comunidades por leis restritivas e até por emenda da Constituição, em busca do equilíbrio que, até aqui, não se alcançou.


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